Conforme publicado ontem, 29 de abril, no Biometricupdate, o Brasil pode ser um dos melhores países para reivindicar indenização por falhas no uso de inteligência artificial.
Essa é a conclusão de uma pesquisa realizada pelo escritório de advocacia TozziniFreire Advogados, que constatou que tais pedidos foram julgados procedentes em recurso em 64% dos casos.
Desde 2010, quando o termo foi mencionado pela primeira vez, a pesquisa constatou que 140 ações judiciais ajuizadas buscaram indenização por falhas de IA, inclusive em reconhecimento facial, conforme divulgado ontem no Biometricupdate.
Embora o volume de casos ainda seja pequeno em comparação com o número total de processos judiciais, especialistas em direito civil enfatizam que a demanda está crescendo e abrangendo temas mais diversos. (Fonte: Valor Econômico)
Essas 140 decisões tiveram a AI como causa direta de pedir, enquanto 711 decisões mencionaram a AI em alguma fase do processo. Além disso, 718 decisões mencionaram a IA como um contexto geral, sem que a IA fosse diretamente o tema central do caso.

Os estados com maior número de casos sobre AI foram São Paulo (61 casos) e Rio Grande do Sul (49 casos).
Sofia Kilmar, sócia do escritório de contencioso da TozziniFreira, explicou que a maioria dos casos envolvia prevenção de fraudes financeiras, IA para reconhecimento facial e remoção de produtos que violavam os termos de uso do marketplace.
Anteriormente, a IA era mencionada apenas em casos relacionados à organização de conteúdo na internet, mas a partir de 2016 os temas começaram a se diversificar.
Segundo Kilmar, houve 50 casos que questionavam processos de busca e algoritmos utilizados por plataformas tecnológicas. Uma decisão de 2021 do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), por exemplo, já mencionava o uso de IA em processos de exclusão de contas em plataformas tecnológicas.
Conforme sua declaração dada ao Valor Econômico, “Sabe-se que diversas medidas adotadas em ambientes digitais decorrem de decisões tomadas por máquinas por meio da aplicação de algoritmos”, afirmou a decisão em um caso que questionava a suspensão de uma conta de uma empresa no WhatsApp, onde a Meta não justificou a exclusão nem a notificação prévia, levando à decisão de restabelecimento da conta (caso nº 1.0000.20.597631-9/001).
Kilmar afirmou que os tribunais não fizeram distinção entre algoritmo e IA em processos judiciais, e que isso é intencional para ampliar a análise do nível de risco representado pela tecnologia. Essa falta de distinção também reflete o projeto de lei nº 2.338, atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados, com o objetivo de manter o conceito amplo para analisar o nível de risco da tecnologia.
Algoritmos, IA generativa, reconhecimento facial, deepfakes e formas de automação são tratados da mesma forma. Fraude bancária e IA foram os principais problemas em 49 casos, com um precedente legal estabelecido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que concluiu que um banco possui conhecimento tecnológico suficiente para prevenir práticas fraudulentas, “incluindo o uso de inteligência artificial para detectar perfis de consumidores e as transações realizadas”.
Segindo o Valor Econômico, o único precedente do STJ sobre o tema foi uma decisão monocrática da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, que não analisou o mérito do pedido do Banco Itaú devido à aplicação do Precedente 7, mantendo a decisão do tribunal de apelação. Uma indenização de R$ 5.000 foi concedida aos autores (caso nº 1010322-67.2018.8.26.0152).
O reconhecimento facial, conforme artido de ontem do Biometricupdate, foi mencionado pela primeira vez em 2021, mas passou a aparecer com muito mais frequência, com problemas relacionados ao reconhecimento de rostos negros e falta de transparência em relação ao uso de dados e armazenamento sensíveis.

Tertullyano Marques Sousa, da Marcelo Tostes Advogados, aponta que o uso dessa tecnologia ainda apresenta desafios, como a falta de precisão no reconhecimento de rostos negros e a falta de transparência no armazenamento e uso de dados sensíveis, levantando questões sobre a adequação e necessidade do reconhecimento facial para operações rotineiras.
Por exemplo, houve um caso envolvendo um motorista de aplicativo de transporte que foi removido da plataforma porque o sistema de IA não reconheceu seu rosto como o da pessoa cadastrada. Segundo a 2ª Câmara Cível, as partes concordaram, ao assinar o contrato, com a possibilidade de rescisão unilateral, e que o judiciário não poderia impor a continuidade do contrato (caso nº 0707611-32.2021.8.07.0009). (Fonte: Valor Econômico)
Observa-se que não há legislação específica sobre o assunto, de modo que a maioria dos processos cíveis se baseia no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078 de 1991) e no Código Civil (Lei nº 10.406 de 2002). O próprio Projeto de Lei 2.338 se baseia nas disposições dessas duas leis, que já possuem aplicação e jurisprudência consolidadas.
De acordo com Camillia Jimene, sócia da Opice Blum, o maior desafio que os legislativos e judiciários enfrentarão no mundo todo será em relação à propriedade intelectual e à IA. Poucos casos envolvendo direitos de imagem chegaram ao Judiciário até o momento, mas o número tende a aumentar.
Em outubro de 2024, por exemplo, o TJSP analisou a reivindicação de uma emissora que alegou que um shopping usou sua voz em uma campanha publicitária sem autorização. O shopping, por sua vez, afirmou que a peça foi produzida por inteligência artificial (caso nº 1119021-41.2023.8.26.0100).

Os juízes da 6ª Câmara de Direito Privado identificaram uma possível ocorrência de plágio e violação de direitos da personalidade, pois “as tecnologias de IA se baseiam em bancos de dados preexistentes”, revertendo a decisão que havia negado o pedido da emissora e ordenando a produção de prova pericial.
Segundo Camilla Jimene, este é o ponto crucial: “Para que as ferramentas de IA generativa produzam conteúdo, elas precisam ser treinadas com conteúdo existente. É aí que surgirão discussões e litígios”.
Segundo o Valor Econômico ela acredita que essa discussão não demorará a chegar ao Brasil, pois grandes empresas de tecnologia tendem a usar o país como um polo de apoio para operações em toda a América Latina. E quando chegar, provavelmente haverá disparidades nas condições de julgamento em diferentes locais e instâncias.
“Na esfera cível, os juízes podem nomear peritos em computação forense selecionando profissionais do mercado. Na esfera criminal, no entanto, a perícia depende dos institutos forenses, e depende de cada estado conseguir se equipar com ferramentas e treinamento para trabalhar com esse assunto”, afirma. Essa discrepância se torna ainda mais relevante dado que o uso da IA também terá significativas repercussões criminais, prevê Jimene. “Ainda não chegamos às camadas mais profundas do debate sobre inteligência artificial.”
Fontes: Biometricupdate e Valor Econômico
Entrevista com Florence Terada e Camilla Jimene sobre validade jurídica das assinaturas eletrônicas e digitais
Resposta a incidentes de cibersegurança: Tudo o que você precisa saber
doc9 capta R$ 35 milhões com a Headline para revolucionar mercado jurídico brasileiro

Em nossa coluna LEGALTECH, sobre direito e tecnologia, você encontra excelentes artigos sobre a legislação brasileira e internacional relacionada à tecnologia e aplicações da tecnologia na prática jurídica. Acesse agora mesmo!
Inteligência Editorial que Orienta Cenários

Desde 2014, o Crypto ID oferece conteúdo editorial sobre tecnologia, segurança e regulação. Há 11 anos provocamos reflexão que sustentam decisões estratégicas para transformação digital e cibersegurança.
Siga o Crypto ID no LinkedIn agora mesmo!






























