Nova plataforma da Receita Federal promete processar 70 bilhões de documentos fiscais por ano, integrando tributos e inaugurando uma nova era de gestão tributária no Brasil
Sob a liderança da Receita Federal e do Ministério da Fazenda, o governo brasileiro desenvolve uma superplataforma digital para viabilizar a reforma tributária do consumo.
O sistema, que já está em fase de testes com 500 empresas, será responsável por centralizar a cobrança de tributos como CBS, IBS e Imposto Seletivo, além de unificar processos hoje fragmentados em PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Com capacidade de cruzar dados em escala inédita — 150 vezes superior ao Pix em volume de informações —, a ferramenta inaugura uma nova fase de controle fiscal, simplificação tributária e gestão de dados econômicos.
A liderança política e técnica

O projeto da “superplataforma” que vai sustentar a reforma tributária do consumo no Brasil tem, hoje, uma liderança claramente identificada: Bernard Appy, secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda.
Ele é o coordenador de grupos técnicos centrais, como o GT-20, responsável por desenhar o modelo de split payment — mecanismo que dividirá automaticamente, em tempo real, os impostos devidos entre União, estados e municípios.
Segundo o próprio Ministério da Fazenda, “o split payment está sendo desenvolvido para ter mínima interferência nas práticas comerciais”, como declarou Appy em março de 2025 em notícia oficial publicada no portal gov.br. Isso revela uma preocupação dupla: manter a simplicidade para o contribuinte e, ao mesmo tempo, garantir eficácia para a arrecadação.
Do lado operacional, quem executa a construção tecnológica é a Receita Federal do Brasil (RFB), em parceria direta com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). Essa combinação de liderança política, administrativa e técnica dá forma a um projeto considerado sem precedentes na história da tributação brasileira.
O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já afirmou publicamente que “foram investidos R$ 1,6 bilhão apenas em tecnologia para criar o sistema da Reforma Tributária” e que a estrutura será “156 vezes maior que o Pix”, em volume de informações processadas, de acordo com a Agência Gov.br.
Quem constrói a plataforma
Embora o comando esteja no Ministério da Fazenda, a engrenagem técnica fica por conta do Serpro, estatal de TI com experiência em sistemas de alta complexidade como a Nota Fiscal Eletrônica, a Carteira Digital de Trânsito e a plataforma Gov.br.
De acordo com notícia oficial publicada pelo próprio Serpro em 2024, já está em andamento uma Prova de Conceito (PoC) que usa dados mascarados da Receita Federal para validar modelos arquiteturais da plataforma. Essa etapa envolve entregas bimestrais hospedadas na Nuvem de Governo, testando escalabilidade, segurança e interoperabilidade dos sistemas.
Além disso, o Serpro coordena a criação de um portal específico da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que começou sua fase de testes em julho de 2025 com 66 empresas e deve alcançar cerca de 500 participantes até o final do ano, segundo o portal serpro.gov.br.
Esse piloto permite que empresas de grande porte, escritórios de contabilidade e provedores de software validem APIs, modelos de integração e funcionalidades centrais, como cálculo automático de tributos e emissão de alertas em caso de inconsistências.
A arquitetura legal e institucional
O fundamento jurídico dessa superplataforma é a Emenda Constitucional nº 132/2023, que instituiu a reforma tributária do consumo. A partir dela, foram editadas leis complementares, como a Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a CBS, o IBS e o Imposto Seletivo.
O Comitê Gestor do IBS, criado para administrar o imposto de competência estadual e municipal, será um dos pilares institucionais da plataforma. Ele terá a função de gerir a arrecadação e a distribuição de recursos, garantindo a repartição federativa em conformidade com os dispositivos da reforma.
No plano executivo, há 32 grupos de trabalho responsáveis pela construção dos módulos de tecnologia e 30 grupos de regulamentação, formados por servidores da Receita, especialistas do Serpro, representantes de estados e municípios e entidades de classe.
Esse arranjo busca dar representatividade e legitimação ao projeto, além de mitigar resistências políticas, especialmente em um país onde a guerra fiscal entre estados foi regra durante décadas.
O que é a “superplataforma”
A Receita Federal descreve o sistema como uma infraestrutura digital inédita voltada para processar algo em torno de 70 bilhões de documentos eletrônicos por ano. Cada documento — como uma nota fiscal — traz dezenas de campos (produto, valor, remetente, destinatário, tributos incidentes), multiplicando exponencialmente a complexidade do processamento.
Em comparação, uma transação Pix envolve apenas alguns dados: valor, pagador, recebedor e hora da operação. Já uma nota fiscal eletrônica pode conter até centenas de informações, especialmente quando envolve cadeias produtivas complexas.
A comparação feita pelo governo de que a plataforma será “150 vezes maior que o Pix” não se refere a valores transacionados, mas ao volume bruto de dados que precisará ser processado, validado e armazenado.
Funcionalidades centrais
Entre as principais funcionalidades previstas para a superplataforma, destacam-se:
- Split payment: divisão automática dos tributos devidos em cada operação, em tempo real, para União, estados e municípios.
- Devolução rápida de créditos tributários: promessa de encurtar prazos e dar liquidez às empresas.
- Unificação de obrigações: substituição de tributos como PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS pela CBS, IBS e Imposto Seletivo.
- Controle em tempo real: cada compra, venda ou prestação de serviço será registrada e processada instantaneamente.
- APIs para integração: empresas de tecnologia e contabilidade poderão conectar seus sistemas à plataforma, automatizando rotinas.
- Acesso pelo Gov.br: a autenticação será integrada ao ecossistema de identidade digital do governo.
Cronograma (roadmap)
O roadmap oficial divulgado até agora indica:
- 2024 – Prova de Conceito iniciada pelo Serpro com dados mascarados.
- Julho/2025 – início da fase de testes do portal CBS com 66 empresas; expansão para 500 até dezembro.
- 2026 – início da operação experimental da plataforma, ainda em caráter restrito.
- 2027 – implantação progressiva do split payment em operações B2B.
- 2028-2029 – expansão para operações com consumidores finais (varejo).
- 2032-2033 – implementação plena da plataforma, abrangendo todos os tributos previstos na reforma.
Vantagens esperadas
- Simplificação: menos tributos, menos declarações, maior padronização.
- Eficiência arrecadatória: redução da sonegação, arrecadação em tempo real.
- Agilidade para empresas: devolução de créditos mais rápida.
- Transparência federativa: União, estados e municípios terão clareza na arrecadação compartilhada.
Desafios e críticas
Apesar dos avanços, especialistas alertam para riscos:
- Privacidade de dados: o Estado terá um mapa detalhado do comportamento econômico da população.
- Custos de adequação: pequenas e médias empresas podem ter dificuldades para adaptar seus sistemas.
- Infraestrutura tecnológica: o desafio de manter um sistema de escala tão grande, com segurança e disponibilidade, é imenso.
- Governança federativa: estados e municípios precisam confiar na plataforma para aceitar a divisão automática das receitas.
Comparações para entender a escala
- O Pix, em 2024, movimentou cerca de 42 bilhões de transações. A nova plataforma processará 70 bilhões de documentos por ano, cada um muito mais complexo.
- O Brasil emite cerca de 30 bilhões de notas fiscais eletrônicas anualmente. A superplataforma deve lidar com mais que o dobro disso, integrando ainda outros tipos de documentos.
- Em termos de investimento, os R$ 1,6 bilhão já alocados superam de longe projetos anteriores de TI do setor público.
Conclusão
A superplataforma da Receita Federal não é apenas uma ferramenta de arrecadação. É, de fato, uma infraestrutura de governança fiscal, que transformará a forma como o Estado brasileiro lida com consumo, arrecadação, repartição federativa e transparência.
Ao mesmo tempo em que representa uma promessa de simplificação e modernidade, traz consigo o risco de ampliar o poder de vigilância do governo e aumentar custos de compliance para empresas menores.
A liderança de Bernard Appy e a parceria técnica entre Receita e Serpro mostram que o governo tem ciência da complexidade. Mas o verdadeiro teste será a confiança do setor privado, a robustez tecnológica e a capacidade política de implementar algo dessa magnitude até 2033.

Descubra o que diferencia o “bom” do “ótimo” na proteção bancária!
Baixe o e-book da HID – Biometric Identity Technologies e veja como transformar segurança em vantagem competitiva, acesse aqui!

Conheça nossa coluna sobre o Mercado Financeiro e leia outros artigos.
Inteligência Editorial que Orienta Cenários

Desde 2014, o Crypto ID oferece conteúdo editorial sobre tecnologia, segurança e regulação. Há 11 anos provocamos reflexão que sustentam decisões estratégicas para transformação digital e cibersegurança.
Siga o Crypto ID no LinkedIn agora mesmo!






























