A recente decisão da 4ª Câmara Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) acendeu um alerta importante para o mercado de assinaturas digitais. A conclusão é clara: não basta que o documento esteja assinado eletronicamente. É fundamental que a assinatura esteja em conformidade com os requisitos técnicos exigidos pelas leis brasileiras e que a identidade atrelada à assinatura eletrônica seja de fato a do signatário que consta no documento
Ao manter o fim de uma ação de revisão por conta de uma procuração eletrônica sem assinatura com certificado digital válida, o Tribunal reafirmou sua posição: documentos de processos judiciais exigem autenticidade comprovada — e, na prática, isso significa assinatura qualificada com certificado ICP-Brasil ou a aplicação do que prevê a MP 2.200-02, que cita a possibilidade de uso de outro tipo de assinatura eletrônica desde que tenha evidências probatórias.
O Caso: Assinatura Rejeitada e Processo Encerrado
O autor da ação apresentou uma procuração assinada por meio de uma plataforma digital que não utiliza o padrão ICP-Brasil. O juiz, na primeira instância, solicitou que o documento fosse corrigido, exigindo uma nova procuração com assinatura reconhecida em cartório ou assinatura qualificada, isto é assinada com certificação digital ICP Brasil. Diante da recusa em regularizar o documento, o processo foi encerrado por falta de comprovação de autenticidade na representação.
Ao reavaliar a decisão, o TJSC não só a confirmou como foi além. O Tribunal, ao perceber que o mesmo documento da procuração em questão havia sido usado repetidamente em vários outros processos muito parecidos, concluindo que havia fortes indícios de que as ações estavam sendo movidas de forma criminosa. Por essa razão, determinou que fossem enviados comunicados à OAB-SC e ao NUMOPEDE para que essas entidades investigassem as possíveis irregularidades de conduta e processuais.
Litigância Abusiva e a Confiança na Justiça
O trabalho do NUMOPEDE – Núcleo de Monitoramento de Perfis de Demandas – é crucial para proteger a integridade do sistema judicial. Ele age para evitar que o Judiciário seja sobrecarregado por pedidos que parecem forjados ou fraudulentos. É uma resposta institucional contra a banalização do processo judicial, usado de forma indevida ou automatizada para pressionar. A decisão do TJSC se baseou em um ponto importante que autoriza o juiz a solicitar a comprovação da autenticidade dos documentos sempre que houver suspeita de abuso na forma como a ação foi proposta.
Para leitores menos atentos, o caso pode parecer apenas uma reafirmação da preferência do Judiciário pela assinatura qualificada. Mas, na verdade, ele revela um dilema mais profundo: como equilibrar a inovação tecnológica com as exigências formais de comprovação da Justiça?
A Visão Técnica: Segurança Além do Certificado
Especialistas em assinatura digital apontam que soluções avançadas — como as oferecidas por plataformas que integram diversos métodos de autenticação — já fornecem um nível de segurança robusto para provar a validade. Elementos como rastreamento detalhado, geolocalização, carimbo do tempo, código de segurança (hash) e validação de biometria via Gov.br são capazes de ligar a assinatura a uma pessoa, local e momento específicos, com altíssimo grau de confiabilidade.
No entanto, plataformas que utilizam múltiplos fatores de autenticação — como biometria facial, validação por CPF e integração com o Gov.br — precisam estar em total conformidade com as leis brasileiras, especialmente em relação à validade das assinaturas eletrônicas em documentos e atos judiciais. As leis que regulamentam o uso de assinaturas eletrônicas fazem distinção entre os tipos simples, avançado e qualificado, sendo este último sempre vinculado à certificação digital no padrão ICP-Brasil.
No caso julgado pelo TJSC, mesmo que a procuração tivesse uma assinatura eletrônica, o seu conteúdo foi considerado inválido para o processo. O principal motivo do encerramento da ação não foi somente a falta de certificação qualificada, mas sim a utilização repetida do mesmo documento para representar pessoas diferentes em várias ações, sem que houvesse uma individualização ou uma prova específica de autenticação para cada caso. Essa prática, além de colocar em risco a segurança jurídica, foi considerada um indício de litigância predatória, conforme reconhecido pelo Tribunal.
Portanto, não é suficiente que a assinatura esteja tecnicamente inserida: é fundamental que o conteúdo do documento tenha sua autenticidade, integridade e adequação ao caso real validadas pelo juízo e o titular da assinatura digital ou eletrônica seja de fato o signatário parte do ato.
“Quando tudo falhar, só restará a criptografia“
Em última análise, todo o debate sobre confiança digital converge para um ponto central: os métodos de autenticação podem mudar ou ser melhorados com o tempo, mas a garantia final da identidade e do sigilo depende da criptografia.
A célebre frase “Quando tudo falhar, só restará a criptografia” é atribuída ao criptógrafo Bruce Schneier, referência global em segurança digital. Essa frase é constantemente citada em apresentações sobre segurança da informação, até mesmo por Edward Snowden – ex-agente da NSA que vazou documentos secretos sobre programas de vigilância do governo americano. Ela resume a confiança de especialistas na criptografia como último bastião da identidade e da privacidade em tempos de colapso tecnológico. E é justamente essa lógica que dá base à assinatura qualificada: sua essência reside na criptografia forte, auditável e ligada a uma infraestrutura pública de confiança —a ICP-Brasil.
A Infraestrutura de Confiança

Em recente publicação da AARB, Jorge Prates, presidente da Associação das Autoridades de Registro do Brasil (AARB), reforçou o papel da ICP-Brasil como infraestrutura pública de confiança. Segundo ele, a certificação digital qualificada é o “alicerce da segurança jurídica nas relações eletrônicas”, garantindo autenticidade, integridade e validade perante o poder público e o Judiciário.
Essa visão institucional ajuda a entender por que, mesmo diante dos avanços tecnológicos, o Judiciário ainda privilegia modelos vinculados à ICP-Brasil: não apenas por sua segurança técnica, mas por seu vínculo com uma política de Estado, auditável e interoperável.
Responsabilidade e Escolhas Técnicas
Advogados são responsáveis por orientar o tipo de assinatura eletrônica e por isso é de sua total responsabilidade os documentos eletrônicos que fazem parte do processo, devendo analisar as decisões locais e as exigências específicas de cada tribunal.
O Bom Senso e a Longevidade Documental
É essencial que os advogados utilizem seu conhecimento na seleção e orientação aos seus clientes sobre cada tipo de documento eletrônico a ser assinado. É preciso analisar a plataforma de assinatura que será utilizada para ter certeza de que o documento cumpre os requisitos técnicos e regulatórios segundo as leis brasileiras. Além disso, é crucial levar em conta a longevidade do tipo de ação processual.
Uma procuração ou um contrato de locação, por exemplo, tem longevidade diferente de uma ação de compra e venda de bens ou um documento com impacto duradouro. Essa distinção segue a mesma lógica aplicada às atividades regulamentadas como saúde, finanças e educação (como nos diplomas digitais), em que o próprio governo exige a assinatura qualificada para a maioria dos documentos justamente porque são atos de longa duração. A ICP-Brasil oferece a presunção legal de validade e a garantia de não-repúdio, assegurando a integridade e a rastreabilidade do documento no longo prazo.

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