Ações contra empresas de fachada saltam de 75 para 738 em 4 anos; reembolso é problema central
A alta do número de fraudes contra convênios médicos fez com que as operadoras de planos de saúde iniciassem ofensiva que inclui exigência de biometria facial para uso de aplicativo, inteligência artificial (IA) para identificar clínicas problemáticas, tentativa de remoção de anúncios fraudulentos e denúncias ao Ministério Público, informa Fabiana Cambricoli.
Levantamento da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) mostra que o número de notícias-crime e ações cíveis movidas pelas operadoras saltou de 75 para 738 entre 2018 a 2022. A investida se dá principalmente em situações que envolvem pedidos de reembolso. Empresas de fachada contratavam planos premium para seus supostos funcionários. Elas simulavam atendimentos e solicitavam reembolsos.
SeA estimativa é de que essas fraudes tenham movimentado R$ 51 milhões.
Diante do aumento de fraudes contra convênios médicos, as operadoras de planos de saúde iniciaram nos últimos meses uma ofensiva contra os fraudadores em um esforço que inclui exigência de biometria facial para uso de aplicativo, ferramentas de inteligência artificial para identificar clínicas problemáticas, tentativa de parceria com o Google para remoção de anúncios fraudulentos e até denúncias ao Ministério Público.
Levantamento inédito da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) obtido pelo Estadão mostra que o número de notícias-crime e ações cíveis movidas pelas operadoras para a denúncia de fraudes subiu 884% entre 2018 a 2022, passando de 75 para 738 procedimentos.
A investida se dá principalmente sobre situações que envolvem pedidos de reembolso, condição em que ocorre a maior parte das fraudes. “Hoje você tem na saúde suplementar todo tipo de fraude. Em uma analogia, há desde o batedor de carteira a organizações criminosas.
O batedor de carteira seria aquele que pede para fracionar o recibo de uma consulta em dois para ter reembolso maior.
E as organizações criminosas são empresas de fachada criadas com o único intuito de fraudar planos de saúde”, diz Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde.
A entidade já apresentou três notícias-crime ao Ministério Público de São Paulo que levaram à abertura de nove inquéritos policiais.
As representações denunciavam contratações fraudulentas de planos de saúde para obtenção de vantagem indevida via reembolso. Pelo esquema, empresas de fachada contratavam planos premium de diferentes operadoras para seus supostos funcionários.
Elas simulavam atendimentos e solicitavam reembolsos por meio de CNPJs de clínicas que fariam parte do esquema. A estimativa é de que essas fraudes tenham envolvido o pagamento indevido de R$ 51 milhões.
De acordo com as empresas, práticas abusivas e fraudulentas em reembolsos se intensificaram a partir de 2021, quando o valor gasto pelas operadoras com esse tipo de pagamento passou a registrar aumento muito superior ao das despesas assistenciais. Levantamento da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), com base em dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mostra que, enquanto as despesas assistenciais aumentaram 0,2% entre 2021 e 2022, o valor gasto com reembolsos subiu 25,6%.
“Fraudes sempre existiram. A diferença é que, quando era tudo analógico, era mais difícil. Com a acelerada digitalização que tivemos na pandemia, as fraudes aumentaram, principalmente pela prática do reembolso assistido”, afirma Cassio Ide Alves, superintendente médico da Abramge.
Ele se refere a clínicas e consultórios que solicitam login e senha dos beneficiários para auxiliar no pedido de reembolso para o convênio, sob o argumento de oferecer maior comodidade ao cliente.
Na prática, porém, algumas dessas clínicas podem se aproveitar do acesso ilimitado ao perfil do cliente para inserir procedimentos não realizados, lançar valores exorbitantes e até trocar a conta bancária informada para reembolso para que o prestador receba diretamente da operadora.
ASSOCIAÇÃO E AGÊNCIA. De acordo com a Abramge, em alguns casos investigados as clínicas chegaram a abrir contas bancárias no nome dos beneficiários sem que eles soubessem para que o reembolso fosse feito em nome do cliente para despistar investigações, mas sem o usuário saber da existência dessa conta, que era administrada pelo fraudador.
Questionada sobre ações que vem realizando para coibir fraudes no setor de saúde suplementar, a ANS informou que as práticas fraudulentas são “apuradas pelos órgãos com competência para tal, como a polícia e o Ministério Público” e caso saiba de alguma conduta do tipo o caso é noticiado a esses órgãos. Informou que, mesmo que não tenha competência para apurar essa prática, “tem buscado soluções para coibir práticas ilegais, como medidas para melhorar a apuração dos fatos no momento da recepção de reclamações de consumidores pelos canais de atendimento”.
Conforme a agência, se você passou login e senha para uma clínica, altere a senha da sua conta no app/site da operadora, verifique o histórico de reembolsos para avaliar se foram feitos pedidos de ressarcimento indevidos, informe a operadora contratada sobre a situação e verifique no site do Banco Central se for aberta indevidamente alguma conta bancária em seu nome
“Por exemplo, no caso de reclamações sobre problemas com reembolso, o atendente do Disque ANS está orientado a perguntar se houve efetivo pagamento pelo procedimento”, informou a ANS.
“Caso a resposta seja que até o momento não foi realizado o pagamento, o atendente informa que o reembolso só é devido após a existência do desembolso prévio, esclarecendo que, se não aconteceu pagamento, não há previsão legal para reembolso por parte da operadora”, disse a agência, em nota oficial. Isso porque algumas clínicas fraudadoras chegam a registrar reclamações (NIP) na ANS para pressionar a operadora a pagar o valor.
Problema identificado
Enquanto as despesas assistenciais aumentam 0,2%, o valor gasto com reembolsos sobe 25,6%
CANCELAMENTOS. “Nesse processo criminoso, o fraudador entra com pedido de reembolso e, na mesma hora, abre uma NIP para que a operadora fique com a corda no pescoço porque, se não resolver, pode pagar uma multa de R$ 80 mil. Muitas vezes a operadora acaba pagando pela pressão e a NIP, criada para proteger o consumidor, está sendo usada de uma forma indevida”, diz Vera Valente, da FenaSaúde.
Só a SulAmérica disse que já teve mil NIPs canceladas após comprovar que as queixas estavam relacionadas a práticas fraudulentas. A ANS disse ainda estar incentivando as operadoras a procurarem os órgãos devidos para investigação de possíveis crimes, como a polícia, o Ministério Público, o Poder Judiciário e os conselhos profissionais.
Fonte: pressreader.com/O Estado de S. Paulo
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