No último dia 16.09.2019 iniciou a tramitação do Projeto de Lei do Senado Federal nº 5051/2019, o qual pretende regular os princípios sobre os quais deverão ser desenvolvidas as atividades e softwares sobre Inteligência Artificial (IA).
Por Rodrigo Fernandes Rebouças
Em sua justificação, o Senador aponta que “[…] apesar das vantagens que a Inteligência Artificial pode trazer, há também riscos associados à sua adoção. Por essa razão, não se pode, de modo inconsequente, adotar a Inteligência Artificial sem uma regulação mínima que traga as garantias necessárias para essa transição.”
No mesmo projeto é determinado que a adoção de sistemas de IA deverão ser acompanhados por um “supervisor” das ações e decisões tomadas pelo sistema, o qual será o responsável para efeitos de responsabilidade civil.
Algumas consequências iniciais que cabem uma reflexão preliminar.
É um tanto quanto temerário pretender regular a IA de forma unilateral, ou seja, apenas com as lentes de quem olha o Brasil. Sabidamente é uma nova forma de relacionamento entre pessoas e tecnologia com impactos globais, devendo ser igualmente buscada uma solução mais abrangente sob a ótica internacional.
O projeto de lei, tal como a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), cria uma nova profissão, ou seja, a de supervisor do sistema de Inteligência Artificial, o qual, deverá ser humano (Art. 4º e parágrafos) e responsável pelas decisões tomadas pelos sistemas de IA.
Ocorrendo o avanço do projeto, abre-se uma nova oportunidade para profissionais e seguradoras, e um novo custo para o desenvolvimento da atividade profissional, devendo ser realizada a Análise Econômica do Direito sobre tais decisões conforme comando da OCDE e da Medida Provisória da Liberdade Econômica (MP 881/20019), a qual aguarda a sanção presidencial para os próximos dias.
No mesmo sentido, é o aparente conflito do projeto com o novo princípio legal proposto pela MP 881/2019 que regular o artigo 170 da Constituição Federal, qual seja, da intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas. Obviamente intervenção subsidiária e excepcional não significa ausência de Estado, mas sim, de sua atuação mínima, o que reforça a ideia de uma diretriz legal internacional, e não apenas nacional.
Dê uma primeira leitura, tem-se a impressão de que o projeto busca desacelerar a evolução tecnológica no setor de IA, como forma de preservar a atividade humana tal como conhecemos atualmente. Me parece que, mais uma vez estamos tomando uma decisão equivocada.
O Estado deveria focar na busca de mais educação básica e efetivo preparo dos professores, profissionais e de toda a população para as necessidades atuais e futuras.
Há mais de 60 anos que realizamos escolhas erradas. Ao invés de investimentos em educação, desenvolvimento e preparo das gerações atuais e futuras, as quais precisam estar prontas para os novos desafios que se apresentam, temos reiteradamente tomado decisões equivocadas de políticas públicas com foco no protecionismo, no isolamento e de fornecimento de bolsas, das mais variadas possíveis. Não há uma efetiva preocupação com o desenvolvimento e o preparo para enfrentar tais desafios.
Basta verificarmos a situação do Brasil e da Coreia do Sul há 60 anos e quais as decisões de políticas públicas que cada um desses países optou, o que resulta nas enormes diferenças de evolução entre cada uma desses países e a realidade atual da Corei da Sul, um exemplo a ser seguido.
Me parece, como estudioso do direito digital e de suas mais diversas nuances que, tais princípios deveriam focar em questões éticas e com viés de internacionalização, ao invés de termos mais uma norma protecionista e que trata o cidadão como “um coitado” que precisa sempre estar sob o manto do Poder Estatal. Precisamos de mais educação, de mais preparo profissional para o presente e para o futuro. Precisamos de mais preparo para os novos desafios com o desenvolvimento pessoal de soft skills e hard skills, com ética e em constante busca de um desenvolvimento sustentável conforme pilares do capitalismo consciente.
[1] Professor e Advogado de Direito Privado, especialmente teoria geral do direito privado, direito das obrigações, direito dos contratos, direito digital, direito do consumidor, direito empresarial, proteção de dados e privacidade. Doutor (2017) e Mestre (2012) em Direito Civil pela PUC/SP. Pós-graduado lato-sensu em Direito Processual Civil pela FMU (1998). Especialista em Direito dos Contratos (2007), Direito das Novas Tecnologias (2004) e Direito Tributário (2002) pelo CEU/IICS, Especialista em Gestão de Serviços Jurídicos pela FGV-Law/SP e Especialista em Gestão de Departamentos Jurídicos pelo Insper. Advogado e Consultor Jurídico no Estado de São Paulo. Coordenador do Núcleo Temático de Direito Digital da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (2019-). Diretor de Relações Institucionais do IASP, Instituto dos Advogados de São Paulo para os triênios 2013-2015 e 2016-2018. Professor dos programas do pós-graduação no IBMEC/SP, FADI, UNIFOR, Escola Paulista da Magistratura, Insper Direito e CEU Law School. Professor do programa de graduação em direito da FADITU (2019- ). Ex-coordenador do PGLS do Insper Direito e do CEU Law School. Ex-professor assistente/voluntário do Prof. Everaldo Augusto Cambler na PUC/SP na disciplina de Direito Civil. Professor convidado e palestrante em diversas universidades, entidades de classes, associações e institutos nacionais. Autor de artigos, capítulos de livros e livros jurídicos.
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