E, mais uma vez eu me sinto obrigada a me manifestar sobre o tema. Felizmente, dessa vez não foi por encontrar alguma reportagem absurda ou sensacionalista.
Mas porque me deparei com um estudo fresquíssimo (de dezembro de 2018) que verificou se médicos ingleses da assistência primária acreditavam que a Inteligência Artificial (IA) poderia substituí-los.
Por Marina Perroni
Não vou me propor a discutir estatística ou a metodologia da pesquisa aqui. Quero é me focar nos resultados e, principalmente, no que eles causaram em mim. E foram duas sensações: entusiasmo e preocupação. Na mesma proporção.
Vou explicar os motivos:
1- Entusiasmo
– porque 94% dos participantes disseram que é extremamente improvável que a IA seja capaz de fornecer cuidado com empatia aos pacientes.
-80% consideram que IA pode nos substituir no preenchimento da documentação dos atendimentos
SIM! entenderam que IA é capaz de nos libertar de tarefas repetitivas e permitir que foquemos naquilo que nos torna humanos e que fazemos de melhor: ser humanos. E cuidar de pacientes, não de burocracia (no papel ou no prontuário eletrônico) de forma empática.
2- Preocupação
– 68% dos meus colegas ingleses acreditam que IA não vai influenciar o ato de fazer diagnósticos
– 61% acham que IA não será capaz de formular planos de tratamento personalizados.
Aparentemente, não tomaram conhecimento de diversas reportagens e estudos que comprovaram o contrário. Já há algoritmos melhores que nós para fazer diagnósticos de pneumonia, câncer de pele e metástases em linfonodos e elencar planos terapêuticos personalizados.
Se isso já não fosse suficiente, parece que a mentalidade da maioria dos colegas escolheu ficar com Esculápio lá na ilha de Kos (não julgo, afinal a Grécia é linda a ponto de causar dispnéia mesmo). É preocupante perceber que grande parte dos médicos não entenderam que os tempos mudaram.
A título de ilustração, deixo aqui um gráfico que demonstra a evolução do conhecimento médico ao longo do tempo:
Sim. É incontestável que o caráter de “arte” da Medicina e a experiência adquirida ao longo de uma vida de assistência médica são poéticos, belíssimos e inspiradores. Mas, isso era suficiente em 1950, quando o conhecimento médico disponível no mundo dobrava a cada 50 anos.
Hoje, ele dobra a cada dois anos. A partir de 2020, isso vai ficar ainda mais rápido. Nosso cérebro, sozinho, já deixou de ser hardware suficiente para processar toda essa informação.
A Medicina Baseada em Evidências foi o primeiro passo para a mudança desse cenário. Agora, aproxima-se uma nova fase e, gostando ou não da nova realidade, os médicos que estiverem familiarizados com o uso das novas tecnologias para auxiliá-los da tomada de melhores decisões terapêuticas vão substituir ou ser priorizados em relação àqueles que não o fizerem.
Em tempos em que se discute se o comunismo e a Telemedicina são ameaças à sociedade, o estudo deixa evidente que, mais do que obrigar estudantes memorizarem o ciclo de Krebs e as artérias do polígono de Willis, há crítica necessidade de promover maior discussão sobre o impacto das novas tecnologias na profissão médica. Na faculdade, nos programas de residência e nas associações médicas.
Marina Perroni
Médica intensivista atuante e defensora de uma maior integração entre tecnologia e saúde. Atualmente, é Medical Advisor da unidade Watson Health na IBM.
Anteriormente, foi a coordenadora médica responsável dos projetos envolvendo as soluções Watson for Oncology, Watson for Genomics e Watson for Drug Discovery.
É Healthcare futurist, TEDx speaker e frequentemente convidada a ser palestrante em eventos relevantes do setor de saúde. É peer-reviewer de artigos sobre Inteligência Artificial e Machine Learning para periódicos científicos da área da Saúde.
Já foi mentora de startups na Berrini Ventures, a primeira aceleradora focada em Saúde na América Latina.
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Conselho Federal de Medicina regulamenta prática da telemedicina no Brasil