Segundo informações do Ministério das Cidades, o governo lançará um novo modelo de Carteira Nacional de Habilitação (CNH), que deverá entrar em vigor em 2019
O documento será feito em plástico, terá novo layout e terá um chip para inserção de dados e informações relativos aos motoristas.
O Ministério das Cidades diz que o recurso facilitará a fiscalização e permitirá o oferecimento de serviços – como pagamento de pedágio, de transporte público e identificação biométrica – por meio de convênios entre instituições e Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Para falar sobre o assunto, entrevistamos Célio Ribeiro, presidente da ABRID – Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia em Identificação Digital que já esteve a frente e acompanha de perto os projetos que envolvem a identificação digital dos cidadãos brasileiros.
Crypto ID: Você está participando desse novo modelo de CNH com chip divulgado ontem?
Célio Ribeiro: É importante que se entenda que esse é um processo que teve início em 2012.
Fizemos parte de um Grupo de trabalho legalmente, oficialmente e devidamente constituído pelo DENATRAN, com a participação do Instituto Nacional de Criminalística da Policia Federal e do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação – ITI.
Naquele momento fizemos estudos e apresentamos Relatório conclusivo ao Denatran sobre o tema. Agora, nas últimas semanas, temos prestado informações e apresentando observações sobre o que se está querendo implantar.
Crypto ID: E o que está se querendo implantar?
Célio Ribeiro: Um cartão em base de policarbonato com gravação a laser, com chip sem contato. Esse cartão é dotado de itens segurança que hoje fazem parte dos documentos de identificação em circulação no mercado.
Crypto ID: Mas esse modelo de documento segue aquilo que foi sugerido no Relatório?
Célio Ribeiro: Não fizemos esse modelo. Não posso dizer que sim nem que não. Como não sei a origem do mesmo, sugeri que fosse encaminhado ao Instituto Nacional de Criminalística da PF, para que possam dar parecer sobre o mesmo. Nossa preocupação é a de que um projeto bom se perca, por causa de dúvidas. O Denatran tem a frente um diretor, que ao meu ver é sério e íntegro. Com certeza ele está atento a movimentos que possam tentar direcionar de alguma forma esse projeto.
Crypto ID: Há 2 meses atrás foi lançada a CNH-e, através de aplicativo no celular. Os modelos são conflitantes?
Célio Ribeiro: São coisas distintas, porém se referem ao mesmo tema. Naquele momento disse sobre a importância do documento físico. Aquele modelo digital não poderia ao meu ver, substituir o documento físico. Era na realidade um formato digital do modelo físico e não um documento eletrônico. Esse novo modelo proposto agora, trata-se realmente do que chamamos de documento eletrônico, pois possui tecnologia embarcada. Possui um chip.
Crypto ID: Mas e o custo disso? Os estados estão preparados?
Célio Ribeiro: Esse é um tema que espero que tenha sido visto e discutido com os órgãos de transito estaduais. Todos sabem que existe um problema sério nas contas dos estados. É claro que esse documento agora proposto tem um custo bem maior do que o documento atual e vai impactar no processo.
Crypto ID: E essa implantação é simples?
Célio Ribeiro: Não é simples nem complicado. É trabalhoso e custoso, porque há de se fazer uma alteração no processo atual em virtude da infraestrutura necessária e personalização dos cartões. Isso impactará em substituição de tecnologia, troca de equipamentos. São equipamentos mais sofisticados e mais caros. Os estados terão que reavaliar seus custos e orçamentos.
Crypto ID: A indústria está preparada para isso?
Célio Ribeiro: A indústria terá que ter tempo para se adaptar. Com relação ao documento em si, se for algo que estamos acostumados a ver no mundo, sim. Teremos apenas que verificar prazos com fornecedores de chip e outros insumos. Com relação a logística e serviços, há também de se fazer uma adaptação e uma reestruturação. A indústria se prepara. O importante é que os órgãos de transito, os Detrans estejam prontos.
Precisam ter planejamento e orçamento, pois eles é que contratam. Não podemos correr o risco, de comprar equipamentos, criar linhas de produção, capacitar pessoal e depois não ter o estado, capacidade financeira para implantação do projeto. Sinceramente não sei se esses estudos foram feitos. Não sei se isso foi discutido internamente. Na época do GT esse tema foi levantado em audiência pública na Câmara dos Deputados e não teve resposta.
Crypto ID: Mas você acredita nesse projeto?
Célio Ribeiro: Precisamos estruturar bem qualquer mudança significativa. As unidades da federação devem estar envolvidas e dispostas a colaborar e assumir suas obrigações. Não quero ver a indústria em risco. Não quero ver as empresas gastando tempo e dinheiro se estruturando e depois ficando com a conta na mão.
Precisamos estar atuando juntos. Órgão federal, órgãos estaduais e indústria representada. Não pode e não deve ser, em minha opinião, algo tratado de forma isolada. Não deve ser a opinião de um ou de outro. Não deve ser a sugestão de uma empresa ou de outra. Precisa ser feito em conjunto, pois hoje é o melhor sistema de identificação que funciona no País.
Crypto ID: Já que você falou em sistema de identificação, como está o ICN?
Célio Ribeiro: Falei em sistema de identificação e não em gerenciamento e administração de banco de dados para consultas.
Crypto ID: Certo. Mudo a pergunta. E sobre o ICN, alguma novidade?
Célio Ribeiro: Sobre o ICN sei o que leio, e acompanho nas poucas informações divulgadas. Solicitamos a participação da indústria, de forma oficial e organizada, mas não tivemos sucesso em nosso pleito. Não tivemos resposta.
O que não pode acontecer, pois macula qualquer processo, é a participação isolada de uma ou de outra pessoa. De uma ou outra empresa.
Crypto ID: Mas isso está ocorrendo?
Célio Ribeiro: Espero e desejo que não. Só disse que isso é o que não pode acontecer.
Crypto ID: Mas pelo que você conhece, esse projeto do ICN irá decolar em quanto tempo?
Célio Ribeiro: Se falarmos de banco de dados, acredito que em um ano possa se ter um banco de dados organizado. Mas é preciso saber da qualidade daquilo que está sendo armazenado. Pois além do que o próprio TSE tem de sua base de dados, também está incorporando outras, através de acordos. Após isso estar tecnicamente viabilizado, poderá estar disponibilizando consultas.
Crypto ID: Essas consultas serão pagas?
Célio Ribeiro: Isso eu não sei responder. Na legislação aprovada é possível que seja cobrada e que seja feita inclusive com a iniciativa privada. Mas hoje sequer sei se terão consultas lá na frente.
Crypto ID: Como assim? O objetivo não é esse?
Célio Ribeiro: O objetivo é a criação de um banco de dados onde seja permitida a consulta ao mesmo. Mas repare… Façamos um link com o modelo proposto para a nova CNH. Se a mesma terá um chip, onde se poderá, com segurança, armazenar os dados biográficos e biométricos do cidadão, para que fazer uma consulta e se pagar por isso? A informação estará disponibilizada ali, com o dono do documento, gravado no seu cartão. Não será necessária qualquer confirmação com banco de dados.
Crypto ID: Então a consulta ao Banco de dados proposta no ICN deixa de existir?
Célio Ribeiro: a princípio sim. Os dados biográficos e biométricos hoje coletados nos estados para emissão da CNH, estão sendo verificados e individualizados através do sistema AFIS. Isso garante a unicidade das informações. No momento em que os dados do indivíduo estarão sendo armazenados de forma segura no cartão, dentro do chip, teremos a certeza de que aquela pessoa é ela mesmo e de que aquele cartão é dela também. Isso poderá ser verificado off line. Cartão x características biométricas, de forma presencial. Com isso para que vai se fazer a consulta ao banco de dados?
Crypto ID: Então o projeto da nova CNH mata o ICN?
Célio Ribeiro: De forma alguma. O banco de dados continuará a existir. O que não deverá mais existir é o serviço de consulta ao banco de dados.
Crypto ID: E a identidade brasileira? E o RIC?
Célio Ribeiro: Pois é. Tanto se fala de identificação, mas quanto ao documento de identificação original, puro, ninguém fala. O ICN é um projeto de criação, gerenciamento e administração de banco de dados, organizado pelo Tribunal Superior Eleitoral, que pode vir a emitir um documento que tenha validade como identificação civil.
A CNH é um documento de porte obrigatório para condutores de veículos automotores emitida pelo DENATRAN através dos DETRANS, e tem validade como documento de identificação civil. Mas cadê o real documento de identificação civil? Cadê a garantia da cidadania através de um documento de identificação forte e seguro? Cadê a necessária transformação tecnológica do mais inseguro documento desse Pais? Onde estão os responsáveis por isso? É preciso se pensar no que está acontecendo. É preciso ver que segurança deve ser tratada pelos órgãos responsáveis por segurança. Há de se ter responsabilidade. Os órgãos de identificação desse país, seja no âmbito federal ou no âmbito das unidades da federação precisam tomar as rédeas desse assunto. Identificação deve e tem que ser tratada por quem entende de identificação.
Por isso continuo acreditando no RIC ou em qualquer outro nome que se de ao projeto de identificação pensado e elaborado pelo Ministério da Justiça, através principalmente do Instituto Nacional de Identificação da Policia Federal – INI/PF, e do Instituto Nacional de Criminalística da Policia Federal – INC/PF e por todos, repare todos os Institutos de Identificação das Unidades da Federação. Pois assim teremos uma identidade feita e cuidada por quem tem que cuidar de identificação. E Não utilizarmos documentos que também tem validade como identidade civil. São coisas muito diferentes.
Crypto ID: Célio, para finalizar, o chip que virá no cartão é chip criptográfico, ou seja, é compatível para o armazenamento de certificados digitais?
Célio Ribeiro: Não. Esse é um chip sem contato, portanto, não está apto a receber um certificado digital ICP-Brasil.
Com informações do Ministério das Cidades