Everardo Maciel, ex-
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Por: Everardo Maciel
A administração pública brasileira, ainda que não seja tida como paradigma internacional, logrou merecido prestígio, ao menos em algumas ilhas de excelência. Esta reputação vem sendo abalada por uma perversa combinação de patrimonialismo, fisiologismo, aparelhamento e corporativismo. Daí decorrem corrupção, perda de eficiência e burocratismo. É lastimável, por exemplo, o estado de “terra arrasada” nos Correios e na Infraero. Sem a mesma dimensão e não necessariamente pelas mesmas causas, há evidências de problemas na administração fiscal.
Hoje, no Brasil, qualquer investigação que envolva pessoas físicas depende de acessos por meio do CPF. De igual forma, os negócios entre particulares, desde os financeiros até os mercantis, recorrem àquele número para identificar os contratantes ou adquirentes.
Há quinze anos, contudo, não era assim. O CPF estava totalmente poluído, porque jamais sofrera uma depuração a fim de eliminar erros de atribuição ou inscrições de falecidos e emigrantes. Pensar no recadastramento de todos os contribuintes seria uma tarefa desgastante, cara e de resultados duvidosos.
A solução desse problema consistiu em universalizar a exigência de declaração – inclusive em relação aos isentos e aos não-residentes – aos que pretendessem manter ativo o CPF, instituindo-se a declaração de isento, de caráter extremamente simples, de fácil e rápido preenchimento, que poderia ser transmitida pela internet, por telefone ou mediante boletos disponíveis em agências lotéricas (neste caso, a um custo irrisório de R$ 0,27).
Qualquer pessoa inscrita no CPF que, por dois anos consecutivos, não apresentasse declaração de renda ou de isento teria sua inscrição automaticamente cancelada. Caso um inscrito ativo não tivesse, por qualquer motivo, declarado, poderia restabelecer a inscrição por meio de uma nova declaração, com pagamento de multa (nos isentos, limitada a R$ 4,50). Tal modelo permitiu que fossem canceladas mais de 60 milhões de inscrições, depurando o cadastro e convertendo a inscrição no CPF, de fato, no número-chave para todas as transações no país.
Essa solução barata e eficiente agora corre perigo, pois a declaração de isentos foi extinta, ao que soube, por uma ininteligível limitação na capacidade de armazenamento de dados na Receita. Em consequência, teremos, em futuro próximo, novamente um CPF pouco confiável.
Ainda que representem documentos com finalidades específicas, não há razão para que existam números distintos para CPF, título de eleitor, carteira de motorista e de identidade. Representam tão somente maior tempo e custo no trânsito de informações, sem falar na ampliação das possibilidades de fraude documental e cadastral.
O caso do número de inscrição no PIS e no Pasep assume contornos teratológicos. Não existem regras para concessão e muito menos de depuração no banco de dados. Não raro, pessoas sem nenhuma má-fé têm vários números de inscrição, tão somente porque a requisição era feita pelo empregador em cada contratação. A substituição desse número de inscrição pelo do CPF mereceria ser examinada, ao menos em nome da assepsia burocrática.
Números de inscrição de contribuintes em cadastros fiscais estaduais e municipais representam uma aberração que somente se explica por caprichos do corporativismo tupiniquim.
O vazamento de informações no âmbito da Receita inspirou soluções estapafúrdias, como a exigência de instrumento público específico na outorga de poderes a terceiros para tratar de matéria protegida por sigilo fiscal. É o que consta da MP nº 507, em tramitação no Congresso. Felizmente, ao menos em relação aos advogados, essa exigência foi afastada por força de liminar concedida pela Justiça Federal.
O recurso à certificação digital, que poderia se contrapor à impossibilidade de atendimento presencial nas unidades da Receita, é ainda caro, burocrático e com oferta limitada a um pequeno número de agentes certificadores.
A digitalização dos processos fiscais não prosperou, porque foi estruturada com base em software livre, cuja implementação termina sendo ruim e, paradoxalmente, cara.
O Banco Central do Brasil exige que os brasileiros declarem, sob pena de multa, seus ativos no exterior. São exatamente as mesmas informações prestadas à Receita, igualmente sob as penas da lei. Os objetivos dessas declarações são distintos. O Código Tributário Nacional, contudo, admite o intercâmbio de informações entre entidades administrativas. Por que, portanto, molestar o cidadão com tais obrigações? Exigência redundante de informações ao cidadão deveria ser tipificada como abuso de autoridade.
Esses exemplos de burocratismo e ineficiência pretendem mostrar que o tema é tão relevante que justificaria cogitar-se da criação de um Ministério da Desburocratização e Eficiência Administrativa. Afinal, seria acrescentar apenas mais um à vasta coleção de 37 ministérios. Além de cuidar de uma inesgotável tarefa, quem sabe ele não poderia recomendar, de pronto, a redução do número de ministérios?
Fonte: Brasilia em dia
Data de Publicação: 12 de fevereiro de 2011
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