ICAIL mostrou que direito e inteligência artificial precisam ser pensados juntos
Por Juliano Maranhão, André Eler, Marcelo Frullani Lopes e Roberto Althoff Bornhausen
O Brasil tem diversos desafios para modernizar a prática do Direito, e um dos caminhos que precisaremos enfrentar é o da Inteligência Artificial. O último relatório do Conselho Nacional de Justiça mostrava que ainda antes da pandemia havia 77 milhões de processos pendentes de julgamento.
A necessidade de aumentar a produtividade e, ao mesmo tempo, melhorar a qualidade das decisões e uniformizar parâmetros é um dos desafios do campo da Inteligência Artificial e Direito.
Também neste ano passou a funcionar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, que provavelmente precisará importar avanços do campo da Inteligência Artificial para poder fazer valer a fiscalização do tratamento de dados pessoais no País, além de aplicar o controle sobre decisões automatizadas previsto no seu art. 20, inclusive quanto a auditorias sobre sistemas de Inteligência Artificial que possam conter vieses. No início de 2020, segundo a AB2L, já havia 150 lawtechs e legaltechs no Brasil, antenadas com essa realidade.
Com esse desafio gigantesco, a academia também aponta para soluções para uma prática do direito que se conecte com os avanços tecnológicos. Nesse contexto, a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo recebeu, no final de junho, o ICAIL 2021, Conferência Internacional de Inteligência Artificial e Direito, o principal evento acadêmico sobre o assunto no mundo.
A sessão de abertura do ICAIL teve a participação do presidente do TSE e ministro do STF, Luís Roberto Barroso. O ministro mostrou a preocupação sobre a evolução do direito para essa nova realidade de domínio da técnica pela humanidade.
A conferência contou com pesquisadores de 19 países apresentando trabalhos de ponta em direito e IA, para 1.500 inscritos oriundos de 65 países diferentes.
Entre as pesquisas, havia desde discussões mais teóricas sobre a aplicação de lógica e representação do conhecimento no processo de decisão até o teste de soluções práticas de inteligência artificial em vários campos: a conversão de legislação de copyright a códigos, proposições de modelo para sopesamento de valores por máquinas em decisões tomadas por IA, modelos de negociações automáticas de disputas, métodos automatizados de compliance com legislação de proteção de dados, modelos de linguagem especializado em direito penal, entre vários outros.
Além disso, houve, como era de se esperar, uma série de discussões jurídicas e morais sobre limites das aplicações da inteligência artificial no direito e se os resultados alcançados por esses processos garantem por exemplo a legitimidade que se espera de um sistema judicial.
Por fim, discutiu-se a questão da responsabilidade civil por danos causados por máquinas dotadas de inteligência artificial.
O fato de o evento ter sido sediado na USP, ainda que de forma virtual, devido às restrições impostas pela pandemia, mostra o quanto o Brasil pode estar na ponta do desenvolvimento dessas soluções — e investir nisso é um tanto mais urgente dado o tamanho dos desafios do nosso sistema judicial e da aplicação do direito no país.
O ICAIL 2021 é um passo no sentido de aproximar ainda mais brasileiros dessas discussões de ponta, que, aliás, estão todas acessíveis no Youtube do Instituto Lawgorithm, como um legado do evento.
Assim, também poderá incentivar novos pesquisadores a explorar a interdisciplinaridade entre direito e ciência da computação, para impulsionar, no Brasil, o desenvolvimento da inteligência artificial de modo ético e confiável.
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