Marcelo Pagotti, que assumiu a Secretaria de Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento – STI , se tem a certeza que precisa acelerar a adoção da biometria, para melhorar o atendimento ao cidadão, não sabe ainda qual é a melhor solução para lidar com aqueles dados de governo totalmente abertos nem exclusivamente sigilosos, assunto que, admite, é polêmico em qualquer cenário. Mas, por outro lado, tem a certeza de que as estatais como Dataprev e Serpro têm que se capacitar para disputar o mercado de nuvem e de serviços com empresas de porte como Amazon, pois em sua avaliação, todas as nuvens deverão estar sendo orquestradas por sua secretaria, para prestar serviços ao governo.
Tele.Síntese – Quais são as suas prioridades?
Marcelo Pagotti– Hoje a Casa Civil está priorizando o que a gente chama “Portal da Cidadania”, que é disponibilizar o serviço para o cidadão de um jeito simples, evitar que ele precise ir em várias agências para pegar uma informação de governo. Exemplo: para tirar o passaporte você tem que apresentar comprovante de eleição. Se for homem, você tem que apresentar quitação militar, também uma informação de governo. Queremos simplificar a vida do cidadão. Como é que a gente pode simplificar? Olhar como o governo oferece o serviço hoje e como a gente pode digitalizar de uma maneira mais racional. Ganha a população, ganha o governo, porque há um custo disso hoje. O custo de manter agências, seja do INSS, Ministério do Trabalho ou qualquer ponto de atendimento físico é muito caro para o governo. Quanto mais a gente trouxer o cidadão para um serviço digital de qualidade é importante.
Tele.Síntese – Uma das últimas decisões do ex-secretário Cristiano em relação aos serviços de nuvem foi limitar a circulação dos dados do governo em Território Nacional. Essa política será mantida?
Pagotti – O assunto nuvem está borbulhando.
Tele.Síntese -O TCU deu uma instrução em relação a isso.
Pagotti – Nós estamos fazendo um trabalho anterior. Estamos vendo quais são os dados que o governo tem e classificando esses dados em três grandes eixos. Dados abertos, que são os dados que o governo oferece à população, para que sejam utilizados, manipulados e tirados deles informação. E a gente entende que, como é um dado aberto, pode estar em uma nuvem sem grande proteção ou sem grandes requisitos de segurança.
Temos ainda os dados de governo, que são utilizados para políticas públicas que têm alguma criticidade em relação a algum sigilo, seja tributário, seja fiscal. Esses têm que estar em uma nuvem híbrida ou data center. E temos os dados de soberania nacional. Esses a gente nem fala de ir para a nuvem. O primeiro esta bem definido e o último está bem definido. Esse miolo é que a gente está avaliando o quanto eu consigo ir para a nuvem. Há uma discussão grande no Congresso sobre dados pessoais, uma série de coisas que temos que ficar de olho. Estamos fazendo um trabalho junto como Ministério da Justiça para ver o quanto que uma lei não pode impactar nesse tipo de decisão.
Tele.Síntese – Essa recente fusão de plataformas entre o Whatsapp e o Facebook, virou uma preocupação tanto dos Estados Unidos quanto da comunidade Europeia. Aqui no Brasil eu sinto uma certa ausência de quem é que vai cuidar disso. Quem vai se responsabilizar pela guarda de nossos dados…
Pagotti – Sou conselheiro do CGI (Comitê Gestor da Internet), e nós temos discussão dessa questão, mas está na nuvem (rs) vamos dizer assim, ainda não está bem definida. O Ministério da Justiça tem algumas ações, o Ministério da Ciência e Tecnologia tem algumas ações, o Congresso tem algumas ações, mas acredito que o CGI (estou falando agora como secretário) é o melhor lugar para fazer essa mediação. O Marco Civil é muito claro sobre o que as empresas têm que fazer.
Tele.Síntese – A Comunidade Europeia começou a ficar mais alerta a essa questão
Pagotti – Eles sempre têm uma visão um pouco mais cautelosa em relação a isso. Mas quando a gente fala de nuvem ou quando se fala em globalização dos dados, a gente tem que tomar cuidado: “os dados tem que estar em território nacional.” Quem garante que os dados estão em território nacional? Se a gente partir para algum modelo de ter que ficar no Brasil, eu acho que é muito mais em cima de regulação de lei.
Tele.Síntese – Você acha que é uma decisão de regulação ou uma lei? E a nuvem híbrida? É preciso definir?
Pagotti – Em termos de SISP a gente precisa definir sim, porque tem que padronizar o que que é dado aberto, o que que é dado sensível, o que que é dado particular, o que que é dado pessoal, o que é dado fiscal. Este trabalho estamos fazendo com a Justiça mais o GSI para a partir daí a gente fazer a normatização. Nós vamos trabalhar para contratar uma nuvem, o modelo ainda não sei, para que todo mundo possa utilizar dentro de parâmetros. A ideia é fazer uma habilitação: quem prover nuvem hoje no Brasil e a STI fazer a orquestração dessas nuvens, exemplo: Nuvem “A”para o serviço “A” ou o dado “A”. Nuvem “B” você pode fazer isso… orientando o pessoal do SISP para ir entrando nessas nuvens e disponibilizando serviços. Nós temos concorrentes no mercado; Amazon e uma série de outros, e temos concorrentes aqui dentro do governo; Dataprev , Serpro que são dois players de nuvem que têm que ser habilitados para oferecer esses tipos de serviços. Mais do que a normatização, a gente precisa entregar o produto pronto para o pessoal e eles fazerem a migração mais simples possível.
Tele.Síntese – O que é o SISP?
Pagotti – O SISP é um reunião técnica de TI de todos os órgãos da Administração Pública Federal e que é coordenada pela STI. E uma vez por mês a gente se reúne para discutir desafios, ações em conjunto, GT de sistema, GT de segurança.
Tele.Síntese – Em relação ao papel do Serpro e Dataprev? Mudanças?
Pagotti – Não vou dizer mudanças. Como conselheiro das duas empresas, o que nós vamos fazer é ganhar mais do que estamos fazendo hoje.O governo vai comprar Big Data no futuro? Se prepare para o Big data. O governo está pensando muito mais em como as empresas estão se preparando para oferecer esses serviços, seja para o público interno ou externo.
Tele.Síntese – Essas empresas vão competir no mercado privado?
Pagotti – Como conselheiro não posso falar (risos). Mas é uma boa estratégia. Elas têm autonomia para oferecer serviços seja para o mercado privado, seja para o mercado interno. Acredito que as direções das empresas estão buscando alguma coisa. A Dataprev hoje já oferece serviço de óbito, e serviço consignado para o mercado.
Tele.Síntese – Com a base de dados que as empresas têm, podem oferecer muita coisa?
Pagotti – A base de dados é do governo. Não é da Dataprev nem do Serpro. Eles são prestadores de serviço do governo.
Tele.Síntese – Em relação a biometria, o que você está apostando? Plataforma? Tecnologia?
Pagotti – É mais do que biometria. A gente está trabalhando com barramento de autenticação do cidadão. Hoje cada Ministério tem seu usuário e senha. Se você vai pegar um serviço do ministério “A”, você tem que criar um usuário e senha, um cadastro. A ideia é unificar isso. Então a “Miriam” quando se identificar nesse portal de serviço, nesse Portal da Cidadania, você poderá consumir serviços do governo naquele nível da sua autenticação. Nós apostamos que a biometria é o nível maior de autenticação que a gente pode oferecer hoje. É algo que o cidadão tem e é difícil de ser roubado. Entre as vantagens, além da facilidade para o cidadão, o custo do atendimento e as fraudes diminuem bastante.
Tele.Síntese – Há muita fraude que justifique esse investimento?
Pagotti – A indústria financeira já usa há tempos a biometria. Toda hora a gente vê na mídia pessoas que usam serviços que não eram para a pessoa. Pessoa que estava morta. O Brasil é um país onde nós somos muito criativos. Mas eu não tenho números para falar se reduz as fraudes, a questão é dar conforto para o usuário.
Tele.Síntese – Esse sistemas vão estar disponíveis a partir de quando?
Pagotti – Assinamos acordo com o TSE para utilização de sua base. Nossa intenção é no começo de 2017 já ter um sistema interno do Ministério do Planejamento utilizando a biometria e o Ministério da Saúde já se prontificou a utilizar essa solução nos produtos e serviços disponibilizados.
Tele.Síntese – É meio contraditório porque o Ministério da Saúde vai usar a biometria mas não tem nem o cadastro do SUS no país.
Pagotti – Pelo menos eu vou poder garantir que eu sou eu e que a Miriam é a Miriam. Um pouquinho de cada vez.
Tele.Síntese – Você pensa algo em relação a contratação de TIC, mudança de regra? Como você está em relação a questão de centralização de compras, compras compartilhadas, leilões? O TCU também andou fazendo uma avaliação sobre isso.
Pagotti – O TCU está fazendo um trabalho muito interessante para dar alguns insites para a gente e estamos conversando bastante mas a orientação agora é; primeiro, contratação do serviço. Essa questão de licenciamento, no meu ponto de vista, já passou. A gente tem que contratar como serviço. Software como serviço, plataforma como serviço, infraestrutura como serviço. Estamos também discutindo no SISP o que pode ser comum para todo mundo, para que a gente possa fazer uma aquisição ou entregar esse serviço para todo mundo. Algo não estruturante; controle de inventário, alguma solução de vigilância. Um ponto que todo mundo necessita e que não tem nada pronto ainda, e a gente vá no mercado buscar uma solução.
Tele.Síntese – Uma decisão do TCU em relação ao Ministério da Cultura referente à compra de CDN pode ter mudado o conceito de aquisição dessa tecnologia. Eu não sei se isso impactou as compras governamentais e o mercado?
Pagotti – A gente está estudando isso ainda. Não sei te dizer se vai impactar ou não vai impactar.
Tele.Síntese – E os dados do governo em si?
Pagotti – Este é um ponto interessante. Para a STI é o nosso foco número dois: Governança de dados no governo. A gente está trabalhando fortemente para estruturar as bases de dados: onde está, quem é o dono dessa base de dados e como é que os outros ministérios podem utilizar essa informação.
Tele.Síntese – O governo tem essa massaroca de dados abertos e a sociedade usa pouco, você não acha? Você não acha que a sociedade civil precisa saber mais?
Pagotti – Precisa. Eu estou provocando alguns hackatons, acho que é um jeito de estimular isso aí. Estou estimulando a ABES, ASSESPRO, SOFTEX . Tem bastante coisa legal e alguns casos já de empresas que capturam esses dados hoje não estruturados e já estão oferecendo serviço. O que a gente passou de orientação? Vamos baixar um pouquinho o nível do que o governo oferece de aplicação, chegar em um nível de API para facilitar o consumo desse dado para o pessoal.
Fonte: Tele Síntese