É fato que a saúde pública brasileira é um problema recorrente. Dar conta do recado e fazer a gestão eficiente com poucos recursos é um dos maiores dilemas do setor.
Por Claudio Santos
Nesta direção, implementar transformações é urgente e irreversível. E a Tecnologia da Comunicação e Informação (TIC), os sistemas de suporte a decisão médica baseados em evidências, assim como os gestores de saúde, têm um papel fundamental neste processo de transformação e amadurecimento de toda a cadeia.
Vivemos um cenário marcado por um maior envelhecimento da população, crescimento das taxas de doenças crônicas, de complexas comorbidades e encaminhamentos fracos. Outro grande desafio da saúde pública brasileira é a constante variabilidade no cuidado assistencial, ou seja, as disparidades no atendimento em diferentes localidades e grupos populacionais. É fato que reformas e políticas de Cuidados Integrados, a exemplo do que está sendo feito por outros sistemas de saúde com dilemas parecidos ao redor do mundo, devem ser orquestradas para minimizar os impactos.
Mas o que são cuidados integrados? Este conceito surgiu como um tema-chave na consolidação de medidas em prol da saúde, visando lidar, em especial, com as discrepâncias e descontinuidade do cuidado assistencial e evitar um aumento ainda maior na incidência de erros de diagnóstico e eventos adversos. As definições sobre o que realmente significa são inúmeras, porém, de forma geral, a ideia é migrar de uma abordagem tradicional, com foco na doença, para uma centrada no paciente e na população como um todo. Em outras palavras, Cuidados Integrados nada mais são do que a união dos diferentes agentes no campo da saúde associados a uma abordagem mais holística.
Por outro lado, este processo de transformação envolve algumas barreiras organizacionais e de gerenciamento, tais como: estruturas de governança fragmentadas, falta de colaboração, capacidade limitada em cuidados primários e falta de bons dados ou sistemas de Tecnologia da Informação para promover a integração. Este ambiente desafiador no setor público é um problema exponencial, dado o baixo nível ou em casos específicos até mesmo à ausência completa da Governança Clínica nas redes públicas de saúde.
É nesse ponto que entra a TIC, que se tornou um facilitador-chave no processo de integração dos cuidados de saúde, especialmente nas áreas de integração funcional, clínica e de serviço. Entre as diversas soluções disponíveis em Tecnologia da Informação, os Sistemas de Suporte a Decisões Médicas baseados em evidências Científicas têm atuado como protagonistas nesse cenário de mudança na saúde pública brasileira, como uma relevante e poderosa ferramenta no fluxo de cuidado assistencial nesse ecossistema.
Os benefícios e incrementos na qualidade do atendimento, associados à adoção dessas soluções, podem ser observados em instituições públicas e privadas do mundo todo. Um estudo independente realizado por pesquisadores da Universidade de Harvard nos Estados Unidos, por exemplo, analisou o desempenho de mais de 3,3 mil hospitais, traçando uma comparação entre os que não usavam Sistema de Suporte a Decisão Médica e as mil instituições que utilizavam. Após 3 anos, observou-se uma diminuição da taxa de mortalidade (11,5 mil vidas) nas mil instituições que utilizavam a solução, e uma redução no tempo de internação (de 372 mil dias em 1 ano).
No entanto, quando o assunto é saúde pública, a adoção deste tipo de tecnologia ainda é incipiente, especialmente porque não está clara a ideia de que os custos são bem adequados em comparação com os resultados que são capazes de proporcionar, especialmente no que diz respeitos aos eventos adversos, que matam milhares de brasileiros por ano. O Ministério da Saúde da Espanha, por exemplo, implementou esse tipo de solução em 365 hospitais, em âmbito nacional, beneficiando mais de 260 mil profissionais da saúde. Na esfera municipal podemos citar a New York City Health and Hospitals Corporation, que atende cerca de 1,4 milhão de cidadãos e é considerada a maior organização de saúde municipal dos EUA. A instituição disponibiliza em dispositivos móveis uma solução de suporte às decisões clínicas para 11 hospitais, cinco centros de saúde, seis grandes centros de tratamento e 70 clínicas, espalhados geograficamente. Ambas as instituições notaram melhorias na qualidade do atendimento, agilidade na resolução de dúvidas clínicas, salvando vidas em última instância.
Casos de sucesso e resultados inspiradores não faltam. Está mais do que provado como os Sistemas de Suporte a Decisão Médica podem alavancar a saúde pública e ajudar na tão sonhada eficiência clínica. Este é um caminho sem volta e em curto prazo e acredito que não haverá outra saída, a não ser que esses recursos passem a fazer, definitivamente, parte da agenda dos gestores e líderes da saúde pública brasileira.
*Claudio Santos é Diretor de Negócios Estratégicos para governo da Wolters Kluwer