Crypto ID conversa com especialista em Direito Criminal, Eduardo Maurício, sobre banimento doa plataforma X e as multas de quem tentassem usar com VPN
Após o banimento do X (antigo Twitter), usuários da rede social viram a oportunidade de continuar usando a plataforma através do VPN. Uma VPN (Rede Privada Virtual) é um canal que utiliza criptografa seu tráfego de internet e oculta seu endereço IP, proporcionando privacidade e segurança online.
Porém, a decisão de Alexandre de Moraes repercutiu durante a semana, já que o ministro do STF afirmou que aqueles que usassem do VPN para acessar o X, seriam multados no valor de 50 mil. O que vem assustando algumas pessoas, é que além do valor da multa, a ferramenta não é ilegal no país, fazendo com que a decisão de Moraes, tenha sido contestada por alguns.
Crypto ID teve a oportunidade de entrevistar Dr. Eduardo Maurício, especialista em Direito Criminal, que esclareceu sobre as mais recentes decisões do ministro Alexandre de Moraes. Ele explicou como as pessoas e empresas devem agir para evitar notificações e multas relacionadas a publicações e campanhas de publicidade na plataforma X.
Leia Entrevista na Íntegra!
Multas para Empresas:
Crypto ID: Quais são as implicações legais para empresas brasileiras que utilizarem VPN para acessar a plataforma X?
Eduardo Maurício: A VPN (virtual private network) é um túnel virtual criptografado para navegar na internet com maior privacidade. O serviço é oferecido por diversas empresas em todo mundo, disponível inclusive em softwares de antivírus como forma de aumentar a segurança de navegação na internet.
Assim, não há uma lei que proíba o uso da VPN, especialmente, a Lei nº 12.965/14 (Marco Civil da Internet), adota como um de seus princípios a proteção da privacidade, dos dados pessoais e da liberdade dos modelos de negócio promovidos pela internet.
Crypto ID: Empresas internacionais com operações no Brasil também estão sujeitas às multas impostas pelo STF? Como isso é regulamentado?
Eduardo Maurício: O fato de determinada empresa estar sediada nos Estados Unidos ou outro país não tem o condão de eximi-la do cumprimento das leis e decisões judiciais brasileiras, quando disponibiliza seus serviços para milhões de usuários que se encontram em território brasileiro.
Especificamente sobre empresas que atuam através da internet no Brasil, o art. 11, da Lei nº 12.965/14, em qualquer operação pelo menos um de seus atos ocorra em território nacional, para responder obrigatoriamente a legislação brasileira.
Crypto ID: As sedes de empresas estrangeiras podem compartilhar mensagens e fazer referência ao Brasil sem incorrer em multas?
Eduardo Maurício: Para responder perante a justiça brasileira, a pessoa física ou jurídica deve estar domiciliada ou instalada no Brasil (qualquer que seja a sua nacionalidade); preste serviço aqui ou mesmo que o fato ou ato praticado tenha sido no Brasil, sem essas condicionantes, em regra, não é possível imputar multa por mensagens enviadas fora do país, sob pena de ferir a soberania das demais nações com suas próprias leis.
Acordos Internacionais
Crypto ID: Existem acordos internacionais entre o Brasil e outros países que possam ser utilizados para a aplicação dessas multas?
Eduardo Maurício: Há acordos de cooperação internacional entre as nações, inclusive essa é uma tendência inexorável, notadamente, pelo avanço das relações humanas pela via virtual.
Assim, ocorre compartilhamento de informações, banco de dados, criação de canais de comunicação específicos, entre outras medidas para facilitar a aplicação da lei e defesa dos interesses partilhados.
Um dos acordos mais avançados ocorre na União Europeia, ao permitir que a decisão judicial de um país seja diretamente aplicada em outro, sem necessidade de homologação.
Crypto ID: Como esses acordos podem influenciar a execução de multas para empresas estrangeiras que desobedecem a decisão do STF?
Eduardo Maurício: Primeiro, é importante destacar que um devedor pode ter seus bens constritos no exterior para pagamento de dívida aqui no Brasil. Essa medida ocorre por meio dessa cooperação internacional que, de acordo com a legislação estrangeira, pode buscar e disponibilizar esses bens para as autoridades brasileiras a fim de saldar a dívida contraída aqui no país, a exemplo, do pagamento de uma multa.
Legalidade e Contestação
Crypto ID: A decisão de multar usuários e empresas pelo uso de VPN para acessar a plataforma X é considerada justa ou não do ponto de vista legal?
Eduardo Maurício: O Judiciário é dotado do chamado “poder geral de cautela” que lhe permite determinar todas as medidas coercitivas ou mandamentais necessárias para assegurar o cumprimento de uma ordem judicial.
Nesse contexto, ela é legal em essência, porém deve se analisar o alcance ou o alvo dessa responsabilização, sob pena de tornar a multa em um ato ilícito.
Crypto ID: Quais são os argumentos mais fortes para contestar essa decisão judicial?
Eduardo Maurício: A medida é exclusivamente voltada contra a plataforma X, mas os reflexos disso atingem indevidamente outras pessoas/patrimônios não ligadas ao caso principal, somente a lei tem essa aptidão.
Além disso, até a fiscalização do descumprimento da ordem judicial estaria comprometida devido à falta de descrição de como seria essa tentativa de acesso e outras nuances não definidas, já que os usuários de VPN possuem uma conexão criptografa fora do controle da Anatel.
Além disso, as empresas que exploram o ramo comercial de segurança cibernética com a VPN também serão comprometidas.
Impacto e Consequências
Crypto ID: Quais podem ser as consequências a longo prazo para empresas que continuarem a utilizar a plataforma X através de VPN, apesar das multas?
Eduardo Maurício: É possível vislumbrar um eventual custo extra por esse serviço de VPN e o repasse de valor, obviamente, aos consumidores. Então além da multa, poderá ocorrer um incremento em seus custos operacionais.
Crypto ID: Como essa decisão pode afetar a liberdade de expressão e o uso de tecnologias como VPN no Brasil?
Eduardo Maurício: Positivamente, os acontecimentos acaloraram os debates sobre a liberdade de expressão e isso, naturalmente, causa um amadurecimento da sociedade como um todo porque se debruçaram sobre o tema, como também causa uma popularização da VPN como ferramenta de segurança.
De forma contrária, o novo precedente instalado que extrapolou os limites do processo influenciará outros juízes a atuarem de forma semelhante, inclusive em outras matérias jurídicas.
Comparações Internacionais
Crypto ID: Outros países têm adotado medidas semelhantes para bloquear o acesso a plataformas de redes sociais? Como essas medidas se comparam com a decisão do STF no Brasil?
Eduardo Maurício: Determinados países que buscam o controle e fiscalização dos dados que transitam na internet proibiram alguns aplicativos ou redes sociais por serem verdadeiras fontes de informações estratégicas para seus criadores.
Mas as proibições não atingem diretamente o usuário em si, como o pagamento de multa por exemplo, mas apenas a empresa administradora do aplicativo ou rede social, como acontece com o WhatsApp, tão popular no Brasil, mas proibido na China, Irã, Coreia do Norte e Síria, restringido em outros como Catar, Egito, Jordânia e Emirados Árabes Unidos.
Crypto ID: Existem precedentes internacionais que possam servir de referência para a aplicação ou contestação dessas multas?
Eduardo Maurício: Há muitos casos de aplicação de multas brasileiras para empresas estrangeiras, como por exemplo, em casos envolvendo a Google e o Facebook que foram obrigados a cumprir ordem judicial, sob pena de multa diária, na obtenção de conteúdo de comunicação privada sob controle de provedores de aplicativos de internet sediados no exterior.
A discussão acabou por gerar a ADC nº 51/DF, sobre possibilidade de solicitação direta de dados e comunicações eletrônicas das autoridades nacionais a empresas de tecnologia.
Aspectos Técnicos e Práticos
Crypto ID: Como a identificação e aplicação de multas a usuários e empresas que utilizam VPN para acessar a plataforma X podem ser realizadas na prática?
Eduardo Maurício: Essa questão é um grande entrave a exequibilidade da ordem judicial, já que as VPN fornecem um canal criptografado de comunicação. O serviço é disponibilizado por empresas do mundo todo, cujo controle sobre esse tipo de comunicação ainda está sendo discutida pelos técnicos da Anatel.
Crypto ID: Quais são os desafios técnicos e legais envolvidos na implementação dessa decisão?
Eduardo Maurício: Há um grande trabalho técnico para “quebrar” uma criptografia, em vista do volume de usuários que acessam a plataforma. Soma-se a isso, a reduzida mão-de-obra qualificada para a operacionalizar a fiscalização, em detrimento de outros atos investigativos mais importantes, o que torna inviável a correta execução da ordem, exceto para alvos específicos, como algum usuário de grande projeção.
Para Empresas com Campanhas Pagas Ativas
Crypto ID: Como as empresas brasileiras que tinham campanhas pagas e ativas na plataforma X podem proceder para encerrar seus contratos e solicitar reembolsos ou compensações?
Eduardo Maurício: Em casos parecidos com esse, poderá ser resolvido o contrato por força maior, ou seja, situação imprevisível que tornou inviável a continuidade da relação. Assim, deverá ser apurado investimento de ambas as partes para equalização das obrigações, com possível abertura de campo para uma renegociação, caso haja interesse das partes.
Crypto ID: Quais são os passos legais que essas empresas devem seguir para formalizar a rescisão do contrato com a plataforma X devido ao bloqueio imposto pelo STF?
Eduardo Maurício: Poderá iniciar uma tratativa extrajudicial e em caso negativo, ingressar como uma ação de indenização por descumprimento contratual ou outra medida de interesse na defesa do patrimônio investido.
Crypto ID: O que o senhor sugere para as empresas que estavam com campanhas pagas ativas no momento do bloqueio, em termos de mitigação de perdas financeiras e proteção de seus interesses legais?
Dr. Eduardo Maurício: Primeiramente, deve ser realizado um estudo minucioso sobre o contrato celebrado entre a empresa e a plataforma X, para só então encontrar a via jurídica mais adequada, por isso é importante a consulta de um advogado qualificado na área para mitigar perdas e reaver o valor investido.
Conclusão
A entrevista com o Dr. Eduardo Maurício trouxe à tona importantes considerações sobre o uso de VPNs e as implicações legais decorrentes das recentes decisões do ministro Alexandre de Moraes. O especialista em Direito Criminal destacou a necessidade de empresas e indivíduos estarem atentos às regulamentações para evitar multas e notificações, além de discutir a justiça e a proporcionalidade das sanções impostas. A clareza e a profundidade das explicações fornecidas pelo Dr. Maurício são fundamentais para entender o cenário atual e as possíveis consequências legais.
Nota: As opiniões e declarações feitas pelo Dr. Eduardo Maurício são de sua exclusiva responsabilidade e foram fornecidas ao Crypto ID durante a entrevista.
Eduardo Maurício é advogado no Brasil, em Portugal, na Hungria e na Espanha. Doutorando em Direito – Estado de Derecho y Governanza Global (Justiça, sistema penal y criminologia), pela Universidad D Salamanca – Espanha. Mestre em direito – ciências jurídico criminais, pela Universidade de Coimbra/Portugal. Pós-graduado pela Católica – Faculdade de Direito – Escola de Lisboa em Ciências Jurídicas. Pós-graduado em Direito penal econômico europeu; em Direito das Contraordenações e; em Direito Penal e Compliance, todas pela Universidade de Coimbra/Portugal. Pós-graduado pela PUC-RS em Direito Penal e Criminologia. Pós-graduando pela EBRADI em Direito Penal e Processo Penal. Pós-graduado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) Academy Brasil –em formação para intermediários de futebol. Mentor em Habeas Corpus. Presidente da Comissão Estadual de Direito Penal Internacional da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas (Abracrim).
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