No Dia da Ação pela Igualdade da Mulher (6/9) é crucial examinarmos o papel da IA na promoção pelo avanço (ou não) da igualdade de gênero
Por Ivini Ferraz
No Dia Internacional da Ação pela Igualdade da Mulher (6/9) é crucial examinarmos o papel da Inteligência Artificial (IA) na promoção pelo avanço (ou não) da igualdade de gênero em toda a sociedade.
A IA está revolucionando diversos aspectos de nossas vidas, desde assistentes virtuais até sistemas de recrutamento e diagnósticos médicos.
No entanto, essa revolução tecnológica também traz consigo o risco de amplificar preconceitos e disparidades existentes. Vamos explorar esses desafios ao longo do artigo a seguir.
Disparidade de gênero em STEM
A disparidade de gênero em campos de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM) é um problema antigo e continua a suscitar preocupações em nível global. Embora as mulheres tenham avançado em várias áreas, a representação feminina em STEM permanece significativamente baixa, refletindo desafios estruturais e sociais que precisam ser abordados.
Neste artigo, exploraremos a disparidade de gênero em STEM, o papel da Inteligência Artificial (IA) e como as mulheres estão começando a se destacar nesse campo de atuação.
De acordo com dados da UNESCO, as mulheres representam, globalmente, apenas 30% da força de trabalho em áreas STEM. Essa diferença é mais acentuada em certas disciplinas, como, por exemplo, o índice de apenas 13% de mulheres no campo da Engenharia. Segundo o World Economic Forum, apenas 12,4% de cargos C-Level em áreas de STEM são ocupados por mulheres.
A disparidade se origina de uma combinação de fatores, incluindo estereótipos de gênero, falta de modelos de referência e barreiras institucionais, como ambientes hostis e a falta de suporte durante a educação e o início da carreira de mulheres.
Com o avanço da IA generativa, o cenário pode piorar ainda mais, aumentando a disparidade de gênero e excluindo mais mulheres do mercado, em especial de TI, caso não tenham acesso ao letramento digital e/ou não se mantenham atualizadas sobre os avanços da IA.
Segundo a ONU, até 2050, as disciplinas de STEM devem cobrir 75% da economia de mercado global e, de acordo com a Unesco, somente 35% de estudantes formados em áreas de STEM são mulheres.
É preciso prestar atenção e investir fortemente na educação das meninas desde o nível escolar para que essa lacuna possa ser preenchida quanto antes.
A Inteligência Artificial transformará o mercado de trabalho de forma drástica e irreversível, com a extinção de muitas funções que conhecemos, mas, por outro lado, criando novas profissões e abrindo caminhos, especialmente em STEM.
A sub-representação das mulheres no campo da IA é alarmante. No Brasil, apenas 25% das pessoas trabalhando em IA são mulheres, segundo dados do LinkedIn em 2022. Essa disparidade não é única no Brasil; globalmente, a maioria dos CEOs das grandes empresas de tecnologia e a maior parte dos pesquisadores em IA são homens (Caira, Russo & Aranda, 2023). Isso torna essencial a inclusão de mais mulheres nesses campos para garantir que as soluções de IA sejam justas e equitativas.
Desigualdade Algorítmica
A falta de diversidade no desenvolvimento de Inteligência Artificial (IA) pode resultar em tecnologias que não atendem eficazmente às necessidades de toda a sociedade. Sistemas de IA podem perpetuar preconceitos de gênero, com estudos demonstrando que algoritmos podem exibir vieses, refletindo as opiniões e os preconceitos de suas equipes de desenvolvimento. Isso leva a um potencial de violação de leis antidiscriminação e de igualdade de oportunidades.
Diferentes pesquisas refletem não apenas a sub-representação feminina no desenvolvimento de IA, mas também como os vieses existentes podem ser amplificados pela tecnologia. Por exemplo, 96% dos deepfakes contêm pornografia não consensual com rostos de mulheres (Lamensch, 2023).
Além disso, algoritmos de classificação de imagens tendem a censurar mais fotos de mulheres, e traduções automáticas reforçam estereótipos de gênero em profissões.
À medida que a IA vem influenciando cada vez mais decisões em áreas como recrutamento e concessão de crédito, arriscamos retroceder em conquistas duramente alcançadas se não promovermos a diversidade nas equipes de desenvolvimento de IA e a transparência das empresas sobre os dados usados no treinamento de IA.
Paralelamente, é necessária a atualização das leis de proteção à imagem e combate ao cibercrime. Apenas com ações concretas nessas frentes poderemos garantir que o avanço da IA não amplie as desigualdades existentes, mas sim contribua para uma sociedade mais justa e equitativa.
Desigualdades no mercado de trabalho
De acordo com a mais recente pesquisa do Oliver Wyman Forum, de 2024, com 25 mil adultos trabalhadores pesquisados, 59% dos trabalhadores do sexo masculino com idades entre 18 e 65 anos afirmam usarem ferramentas de IA generativa pelo menos uma vez por semana, enquanto as mulheres utilizam 51%.
O mais preocupante é a diferença entre os trabalhadores jovens, da Geração Z: 71% dos homens entre 18 e 24 anos usam IA generativa, semanalmente, em comparação a 59% de mulheres.
Essa disparidade pode não apenas ampliar os desequilíbrios de gênero nas ocupações tradicionais de “colarinho rosa” (termo criado após a Segunda Guerra Mundial para funções exercidas, em sua maioria, por mulheres), como, por exemplo, atendimento ao cliente, educação, enfermagem e serviço social, mas também limitar as oportunidades para as mulheres nas profissões do futuro, e no campo STEM.
Apesar do aumento no envolvimento de mulheres em projetos de IA e startups de tecnologia, persistem desafios significativos, principalmente no financiamento.
Um levantamento realizado pela revista Startups revela que empresas fundadas por mulheres recebem menos de 12% dos investimentos das maiores gestoras de Venture Capital do Brasil.
Das 901 startups analisadas, apenas 19,54% têm fundadoras mulheres, recebendo somente 11,83% do total investido, evidenciando uma barreira substancial para empreendedoras no setor.
Um outro alarmante estudo da Universidade de St. Gallen revelou que, além das dificuldades já existentes em obter financiamento, empreendedoras enfrentam preconceito baseado na aparência física. A pesquisa mostrou que mulheres consideradas atraentes têm 21% mais chances de conseguir investimentos.
O experimento, envolvendo 111 investidores masculinos, destacou como preconceitos subconscientes influenciam decisões de investimento, mesmo em 2024. Isso ressalta a necessidade urgente de diversificar as equipes de investidores para mitigar distorções baseadas em gênero e aparência.
A introdução da IA no mercado de trabalho traz preocupações adicionais. Estudos mostram que as mulheres têm mais medo de serem substituídas por IA em seus empregos do que os homens (COSTA, 2023). Para o autor, esse temor não é infundado, considerando que muitas profissões tradicionalmente ocupadas por mulheres, especialmente aquelas que envolvem tarefas administrativas, têm alto potencial de automação.
Por onde começar
O domínio da AI pode oferecer oportunidades de desenvolvimento profissional para inúmeras mulheres, abrindo novos caminhos às carreiras em STEM. A educação em IA e o letramento digital podem ajudar a quebrar estereótipos de gênero relacionados à tecnologia, mostrando que mulheres têm capacidade de serem líderes em inovação tecnológica.
Combatendo qualquer tipo de discriminação, o letramento digital refere-se à capacidade dos indivíduos de compreender, criticar e influenciar as tecnologias algorítmicas que moldam grande parte de nossa realidade.
O letramento de IA na área da Educação é extremamente relevante, pois a grande maioria dos professores da rede pública de ensino é formada por mulheres, representando 80% no Brasil. Na educação privada, a proporção de mulheres também é bem alta, com cerca de 75%.
O total de mulheres educadoras ultrapassa 1,6 milhão em todo o país, o que chama a atenção para a necessidade de considerarmos as questões de gênero ao implementar novas tecnologias e políticas educacionais, como projetos de IA nas escolas das redes pública e privada em todo o Brasil.
Com cerca de 80% dos professores da educação básica sendo mulheres, as educadoras precisam ser consideradas as principais agentes de mudança para superarmos este desafio de igualdade de gênero e implementação equitativa de IA na sociedade digital e nas escolas.
Garantir que as mulheres educadoras tenham acesso a um letramento digital de qualidade, pode ampliar a nossa competitividade no setor de tecnologias emergentes e produção científica, inspirando estudantes, especialmente meninas, a seguir carreiras em STEM.
Esta abordagem valoriza o conhecimento profundo que estas educadoras têm sobre as necessidades dos alunos para o desenho de novas políticas educacionais que contemplem as mulheres e sua ascensão a um mercado de trabalho cada vez mais dominado pelas ciências e tecnologias.
Iniciativas que incentivam a presença e a igualdade de gênero
Black in AI: Organiza workshops e oferece mentoria e ajuda financeira para participação em eventos
Queer in AI: Oferece bolsas de estudo para estudantes LGBTQIA + e ajuda com de pós-graduação
Latinx in AI: Foca em estudantes da América Latina, oferecendo mentorias e financiamento
Women in Machine Learning: Workshops anuais com foco em mulheres que trabalham na área.
Women in AI: Oferece programas de aceleração de startups lideradas por mulheres.
Players Multimídia School: Promove o letramento digital para escolas com base na igualdade de gênero
WIT (Women in Information Technology): Apoiado pela Sociedade Brasileira de Computação
Programa Meninas Digitais: Motiva alunas do ensino fundamental e médio a seguir carreira na área de computação.
Conclusão
A disparidade de gênero em STEM é uma questão complexa que requer esforços contínuos para ser solucionada. A inclusão de mulheres na área de IA, além de uma necessidade ética, é também uma oportunidade estratégica para a inclusão de mais mulheres no mercado de trabalho.
A IA tem o potencial de ser uma ferramenta poderosa para promover a igualdade, mas apenas se for desenvolvida e implementada de forma consciente e inclusiva. Como profissionais e líderes na área de tecnologia, temos a responsabilidade de criar uma cultura digital que beneficie a todos, independentemente de gênero, raça ou origem.
Diante desse cenário, há uma urgência em apoiar iniciativas voltadas para mulheres no campo do letramento digital e STEM e implementar políticas e leis que combatam a desigualdade algorítmica.
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