A Lei tenta frear a ludopatia para proteger o apostador, sendo a primeira vez que a liberação das apostas está em debate público nacional
Por Anne Dimantas, Bruno Blum Fonseca e Florence Terada



Sob os holofotes da CPI das Bets, a atividade de apostas esportivas e todos os seus players têm ganhado destaque nacional. Pela primeira vez desde a liberação das apostas esportivas online em 2018, o debate público nacional tem se voltado ao problema do vício dos apostadores, ou ludopatia, reconhecido pela Organização Mundial da Saúde como um transtorno grave.
A oferta de jogos on-line, que já ultrapassa dezenas de opções, possibilitou o alcance instantâneo ao universo das apostas. Esta facilidade pode gerar comportamentos desenfreados com relação às apostas. O que poucos sabem, no entanto, é que a Lei nº 14.790/23, que regulamentou as apostas on-line, e normas da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), já preveem diversos mecanismos e direitos para proteção do apostador.
Sob a perspectiva da casa de apostas, a regulamentação vigente reforça a necessidade de ferramentas de controle e estabelece diversos guias para sua atividade. A forma de divulgação de informações aos apostadores sempre deve ser clara, e as diretrizes para a promoção comercial vedam a veiculação de propagandas que insinuem a certeza de um enriquecimento acelerado ou que incentivem o jogo como forma de complementar a renda.
O agente operador de apostas, além disso, deve não apenas orientar os apostadores sobre sinais de alerta para autovigilância quanto ao risco de dependência e de transtornos do jogo patológico, como também fazer o acompanhamento do comportamento desses usuários quanto a esses riscos.
Neste ponto, vemos clara inspiração no modelo britânico, extremamente robusto devido à tradição nacional de apostar, que construiu um guia de três etapas para as casas de apostas a fim de promover um ambiente seguro: identificar, interagir e avaliar o cliente. O Reino Unido conta, inclusive, com uma autoridade voltada exclusivamente à atividade desde 2005, a UK Gambling Commission (UKGC) ou Comissão de Jogos de Azar.
Já sob a perspectiva de responsabilidade do próprio apostador, as normas trazem a previsão de direitos e, também, de ferramentas para aqueles que reconheçam, em seu comportamento, um potencial lesivo.
Os dados a respeito dos hábitos do apostador podem e devem ser usados a seu favor, servindo para identificar padrões de jogo patológico que, então, devem ser convertidos em ações concretas por parte do fornecedor para ajudar aquele indivíduo.
Ao apostador são conferidos diversos direitos, tais como, o direito de realizar apostas de forma livre, consciente e segura, sem sofrer coações, o direito à informação clara e adequada sobre os produtos e serviços oferecidos pelas plataformas, bem como o encerramento facilitado da conta de apostas e à proteção contra práticas abusivas e à reparação de danos.
Em relação aos mecanismos que visam evitar o comportamento destrutivo de jogadores, se destaca a possibilidade de autoexclusão da conta.
De forma semelhante, no Reino Unido, os apostadores têm a possibilidade de entrar em um acordo de autoexclusão (“self-exclusion”). Nesse cenário, as casas de apostas, sejam elas virtuais ou físicas, devem encerrar a conta do usuário e devolver eventual valor que lá conste. Devem, no mais, remover o nome do apostador e seus dados de contato de bancos de dados de marketing.
Importante notar que existe previsão legal que proíbe a participação de pessoas com diagnóstico de ludopatia de participar, inclusive indiretamente, como apostador. No entanto, a efetividade da norma esbarra em como se daria o controle de acesso de clientes nesta condição.
Como dito, a criação de banco de dados de apostadores com ludopatia pode ser uma medida possível, desde que se tome cautelas quanto ao uso e proteção desses dados pessoais sensíveis, além de criar mecanismos para evitar apostas por ludopatas através de contas de terceiros.
Além disso, tanto no Reino Unido quanto no Brasil, o legislador impôs ao agente de apostas uma responsabilidade social, de modo que ele deve zelar pelo bem-estar dos indivíduos e da coletividade. Nesse sentido, é necessário que cada operador de aposta institua políticas internas – desde que não tenham caráter discriminatório e sejam devidamente embasadas no arcabouço legal.
Sob a perspectiva dos responsáveis pela regulamentação da atividade de apostas, observa-se uma tendência a evitar o agravamento das dívidas e desestimular o jogo ininterrupto. A Secretaria de Prêmios e Apostas determinou a proibição do oferecimento de crédito para apostas e do uso de cartões de crédito para essa finalidade.
Os Ministros de Estado da Fazenda, da Saúde, do Esporte e da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República se uniram para instituir o Grupo de Trabalho de Saúde Mental e de Prevenção e Redução de Danos do Jogo Problemático cujo objetivo é formular e planejar ações de prevenção, redução de danos e assistência a pessoas em situação de comportamento de jogo problemático, e, para isso, poderá articular-se com outros órgãos e entidades públicas.
Os desafios para o enfrentamento do jogo patológico são diversos e complexos, exigindo a atuação coordenada de múltiplos atores públicos e privados. No entanto, a Lei nº 14.790/2023 já oferece um norte relevante ao estabelecer direitos e deveres no âmbito das apostas, constituindo um primeiro passo importante na regulação do setor.
Embora possa, e talvez deva, ser complementada por novas normas e aprimoramentos regulatórios, a Lei vigente já apresenta significativos direitos e obrigações. Por isso, além de se discutir avanços futuros, é essencial garantir a efetiva aplicação da Lei existente, assegurando que os direitos dos apostadores não fiquem apenas no papel, mas se traduzam em proteção real e concreta no ambiente digital de apostas.
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