Programação desta sexta-feira (17), último dia de evento, terá foco nos desafios e oportunidades das novas tecnologias digitais e também na infraestrutura da Internet
A conferência sobre Diversidade na Internet – terceiro encontro em comemoração aos 20 anos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), e o debate sobre a regulamentação das exceções à neutralidade de rede na Lei do Marco Civil nortearam as discussões deste segundo dia de V Fórum da Internet no Brasil e Pré IGF Brasileiro 2015. O evento, realizado pelo CGI.br, segue até esta sexta-feira (17), em Salvador (BA), com a realização do seminário: “Próximo bilhão de conectados – Desafios para o desenvolvimento da Internet no Brasil”.
Público e palestrantes dos setores governamental, empresarial, acadêmico e da sociedade civil voltaram a se reunir na manhã desta quinta-feira (16) para debater o Marco Civil da Internet e sua regulamentação. As interpretações do conceito da neutralidade de rede, as exceções e fiscalização do cumprimento da lei, assim como a prática de zero rating e o projeto Internet.org, do Facebook, foram alguns dos temas que fizeram parte das apresentações dos convidados e dos questionamentos do público durante o painel.
Representante do Centro Tecnologia e Sociedade do FGV Rio, Luca Belli defendeu que a natureza fim-a-fim do tráfego deve ser mantida e cabe ao usuário resolver como usar a Internet, e não a operadora. “Zero rating é uma maneira de alocar os custos. O problema é que essa é uma prática injusta e discriminatória”, criticou. A conselheira do CGI.br, Flávia Lefèvre, completa que o zero rating quebra a neutralidade a partir do momento que a franquia acaba, a operadora bloqueia o acesso e o usuário só consegue acessar determinados aplicativos. Lefèvre defendeu ainda o investimento de políticas públicas na rede de banda larga como a medida mais eficaz para evitar congestionamento de tráfego.
Para o representante do SindiTelebrasil, Alex Castro, a “neutralidade da rede é um conceito importante, mas não é o único que regulamenta a Internet, principalmente os aspectos comerciais”. Ele declarou que os julgamentos sobre o zero rating podem inviabilizar serviços no futuro, “gerando jurisprudência equivocada e prejudicando a Internet”. “Estamos falando de serviços governamentais que poderiam ser disponibilizados de forma gratuita na Internet”, afirmou. Ele considera ainda que é importante que a lei dê flexibilidade aos modelos de negócio e que a regulamentação deve vir para esclarecer e operacionalizar processos.
Ex-conselheiro do CGI.br e representante do Coletivo Intervozes, Gustavo Gindre também chamou atenção para a necessidade de uma estrutura que deve acompanhar e fiscalizar se o princípio da neutralidade de rede não está sendo violado. “Há várias situações onde a lei é maravilhosa e ninguém cumpre”, declarou. E criticou o projeto do Facebook. “Ao permitir um gatekeeper, um portão que controla o tráfego, o Internet.org fere o conceito da neutralidade de rede. Há quem argumente que isso é melhor do que nenhum acesso, mas não se discute o problema de fato. Por que ainda temos pessoas sem acesso à Internet? Isso é inadmissível no debate da construção da cidadania no País”, ressaltou.
O Internet.org não é uma política pública de acesso à Internet, garantiu o representante da Secretaria de Telecomunicações do Ministério das Comunicações, Haitam Naser. “Embora tenha ocorrido uma sinalização da presidenta Dilma Rousseff, não há nenhum tipo de acordo ou contrato firmado entre o Governo Federal e o Facebook. Estamos estudando o funcionamento do Internet.org, pois o projeto envolve não só questões de neutralidade da rede, mas outros aspectos como privacidade e direito do consumidor”. Naser complementa que o Governo não estabeleceu ainda uma entidade que poderá fiscalizar o cumprimento da lei.
20 anos CGI.br
O Ciclo de Conferências “CGI.br 20 anos – princípios para a governança e uso da Internet“, teve, nesta tarde, seu terceiro encontro com debate do princípio “Diversidade” do decálogo do CGI.br. A experiência de uso da Internet por comunidade praticante de xamanismo, na valorização da cultura das periferias e da promoção da igualdade racial e dos direitos humanos foram relatadas, respectivamente, por Maria Izabel Nunes (Fundação Terra Mirim), Enderson Araújo (Mídia Periférica) e Pedro Caribé (Bahia 1798), sob coordenação do conselheiro suplente do CGI.br, Marcelo Cerqueira. O painel contou com participação, por meio de vídeo gravado para o evento, de Ivana Bentes (Ministério da Cultura), que discursou a favor do uso de plataformas livres e celebrou a chegada de vários grupos sociais às redes.
O debate sobre o princípio “Diversidade” continuou em segundo painel com questionamentos aprofundados. João Brant, Secretário-Executivo e ministro interino do Ministério da Cultura, chamou atenção para o poder de mercado avassalador de empresas de Internet. “Hoje, a relação com usuários é tratada com termos de uso e algoritmos que em nada se parecem com a estrutura da Internet aberta que a gente viu nascer”, alertou. “A diversidade fica sujeita aos modelos de negócios e à arquitetura das redes promotora de bolhas e guetos”, criticou. Brant mostrou-se a favor da neutralidade da rede, contrário ao zero rating e expôs projetos caros ao Ministério, como a lei de direitos autorais.
A polarização entre o que é comum e o estímulo à diferença foram analisados por André Lemos, da Universidade Federal da Bahia. “Produzir diversidade e relação de comunhão é algo importante. O desafio é garantir uma visão plural e ao mesmo tempo, produzir identidade”, considerou. Ele lembrou que as redes sociais são criticadas pela produção a partir do que os algoritmos julgam ser interessante. Esses algoritmos, em sua opinião, não devem ser deixados apenas nas mãos dos técnicos. “Deve ser algo politizado”.
Em consonância, Raquel Rennó, da Universidade Federal do Recôncavo Baiano, levantou preocupação com a arquitetura de redes. “Como os usuários irão se informar se os algoritmos irão reproduzir apenas os seus interesses? Quem detém o poder agora é quem filtra essa informação”, avaliou. Ela defendeu a distribuição gratuita na Internet, por exemplo, como meio de incentivo à produção audiovisual indígena e garantia da diversidade. Pe. Maurício da Silva, da Universidade Católica de Salvador, afirmou que a diversidade cultural deve ser preservada. “Quem controla o aspecto cultural que vai se impor? É a auto regulação privada? É o Estado?”, questionou. Em sua apresentação, Pe. Maurício enfatizou que o otimismo social e esperança devem prevalecer na Internet e que cidadãos devem incentivar os valores que querem para si.
Último dia do V Fórum
A programação desta sexta-feira (17) contempla o seminário “Próximo bilhão de conectados – Desafios para o desenvolvimento da Internet no Brasil” e o relato final das quatro trilhas (direitos humanos e Internet, desafios da inclusão digital, economia da Internet e cibersegurança e confiança) realizadas nessa quarta-feira (15), primeiro dia do V Fórum.
Os interessados em participar do Fórum nesta sexta-feira devem realizar as inscrições, que são gratuitas, no local do evento (Fiesta Convention Center – Av. Antonio Carlos Magalhães, 741, Itaigara). Os debates também podem ser acompanhados ao vivo pela Internet no sítio: http://forumdainternet.cgi.br/. O Fórum abre ainda espaço para que os participantes contem sua história no evento. Basta criar uma conta no Cowbird (http://cowbird.com/seed/om3tqm/) e clicar em “Sprout this seed”.